8ª Maratona do Porto
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Esta semana já recomecei os treinos a pensar já na Maratona de Lisboa. A do Porto corri com os meus velhinhos e gastos Adidas Adizero Adios, que me puxaram sobremaneira pelos gémeos (são levezinhos e relativamente planos). Entretanto recebi pelo correio o meu novo modelo, os Adidas Adizero Pro 4, que são ainda mais leves e ainda mais planos. Mal posso esperar para os experimentar!
Desde sempre que gosto de correr. É uma paixão antiga, vivida com maior ou menor intensidade ao longo dos anos, em ocasiões esquecida, noutras reacendida, consoante os caminhos da vida e os desejos do coração.
A minha recordação mais antiga do acto de correr reporta-se aos meus 10 anos quando frequentava o 6º ano e nas aulas de educação física o “stor” nos fazia dar voltas à pista. Depois voltei a correr no 12º ano, quando fiz um programa de intercâmbio nos EUA e me inscrevi na equipa de atletismo onde corria a milha e as duas milhas. Foi nesse longínquo ano de 1985 que corri a minha primeira prova de 10 km, da qual já não recordo o percurso ou o resultado, mas lembro-me vivamente do prazer de competir e da agonia extrema do esforço físico.
Depois disso ainda corri ocasionalmente apenas pelo prazer de correr, mas nunca mais competi em provas de pista ou de estrada. Isto até um ano depois de me nascer o primeiro filho, quando, incentivado por amigos, resolvi inscrever-me numa meia maratona.
Nessa altura essa distância parecia-me imensa e não sabia como haveria de a completar. No entanto como na altura fazia natação todos os dias no Estádio Universitário, já tinha uma preparação física razoável, bastou-me treinar algumas semanas para cumprir o objectivo dos 21,1 km até à meta, em 2h00’, isto em Março de 2002.
Depois disso ainda participei mais algumas vezes nas duas meias maratonas das pontes, e apenas nestas provas, com resultados que oscilavam entre as 1h44’ e as 2h22’ consoante a maior ou menor preparação efectuada especificamente para essas provas.
Em 2009, em resultado da carga de trabalho e stress do MBA que estava a concluir em part-time, acumulando com uma actividade profissional exigente, tinha atingido um peso para mim impensável de 90 kg e um nível de sedentarismo muito pouco saudável. Entrementes, o meu irmão, Jorge Ferreira, já tinha completado a sua primeira Maratona e incitado pelo seu exemplo, em Agosto, tomei a firme decisão de que teria que correr uma Maratona até ao fim do ano.
Preparei-me e em Novembro, juntei-me a um grupo de corredores fantásticos, os Run 4 Fun, de que já devem ter ouvido falar :-), e que muito me têm ajudado a superar-me.
Em Dezembro lá corri a 24ª Maratona de Lisboa, apadrinhado e auxiliado pelo João Ralha, excelente companheiro, que me rebocou durante boa parte da prova. E consegui chegar ao fim, em 4h10, apesar de ter levado em cheio com o “muro” aos 30 e picos kms.
Nos 2 anos que decorreram desde então, já completei 9 maratonas, 7 de estrada e 2 de montanha, e preparo-me agora para completar a 10ª em Dezembro, na 26ª edição da Maratona de Lisboa. Os resultados foram (quase) sempre melhorando desde Dezembro de 2009, na seguinte progressão (em estrada): Lisboa 2009 – 4h10’; Sevilha 2010 – 3h35’; Berlim 2010 – 3h25’, Algarve 2010 – 3h19’; Porto 2010 – 3h09’; Lisboa 2010 – 3h13’ e da mais recente, a do Porto 2011, falarei em seguida.
Percurso da Maratona |
Este ano, nesta distância tinha nos meus planos apenas o AXtrail K42 e as maratonas do Porto e Lisboa. O objectivo traçado era baixar das 3 horas, algo que, com o devido treino, considerava ao meu alcance. Contudo como tanto faço provas de estrada como de trail, não me foi possível fazer um treino específico para esta corrida. Assim, parti para o Porto com a noção clara que teria que arriscar.
No dia da prova acordei bem cedo, às 5 horas, e tomei um pequeno-almoço abundante às 6 horas. Às 8 horas estava na rua a aquecer e a dirigir-me para o local da partida, junto ao Palácio de Cristal. O tempo estava fresco e ensolarado, óptimo para correr.
Lá reencontrei os bravos companheiros da camisola laranja, o António Cruz, o José Carlos Melo, o Luís Correia, o Miguel San-Payo e o Orlando Ferreira, e depois, ao longo da prova tive a felicidade de me cruzar ainda o Carlos Brazão, o Jorge Esteves e o Teodoro Trindade.
Eu e o António ainda fizemos mais um curto aquecimento e dirigimo-nos de imediato para a partida, a fim de ficarmos bem posicionados e não sermos submergidos na habitual atrapalhação das partidas (mas há que reconhecer que a partida da Maratona do Porto é uma das mais ordeiras das provas que conheço).
Deu-se o tiro de partida e eu arranquei rápido para tentar ultrapassar a malta mais lenta e assim entrar no meu “ritmo de cruzeiro” o mais cedo possível. Tivemos um 1º km a subir, onde o meu coração atingiu os 152 bpm e depois começámos uma descida de vários quilómetros pela Avenida da Boavista, em direcção ao Castelo do Queijo e depois a Foz.
Antes do tiro de partida, tinha trocado impressões com o António e concluímos que tínhamos estratégias muito semelhantes para abordar esta corrida.
Como ele já soberbamente descreveu no seu post (os post do António são sempre uma fonte única de útil informação científica e inspiradora experiência pessoal), pretendíamos começar com uma intensidade cardíaca menor e subir de intensidade ao longo da prova. E uma vez que o perfil altimétrico da prova começa a descer e acaba a subir, resolvemos também fazer a 1ª metade mais rápida do que a 2ª, o que não é contraditório com aquilo que afirmámos acerca da intensidade cardíaca. Para mim esta estratégia fazia sentido pois, baseado na experiência do ano anterior, parecia-me que precisaria de atingir a marca dos 21,1 km em menos de 1h28’30’’ se queria ter tempo para completar os últimos kms, a subir (mesmo que ligeiramente) e provavelmente contra o vento do norte.
Enfim, queria ter uma folga razoável, pois bem sei que a Maratona começa a doer a sério a partir do 2º terço.
Os primeiros 10 kms foram completados muito rapidamente, com ritmos entre os 4’00’’/km e os 4’13’’/km. Passei a marca dos 10 km em cerca de 41’15’’, dentro do plano. Desde cedo me adiantei do balão das 3h, a fim de cumprir o meu plano, mas agora corria isolado e começava a sentir a falta de companhia e de alguma protecção contra o vento ligeiro que se fazia sentir.
Acelerei um pouco para tentar apanhar os atletas que corriam algumas dezenas de metros à minha frente. Corríamos agora junto ao rio, num passeio lindíssimo que enchia a alma de júbilo. Os populares incentivavam-nos alegremente, com regionalismos típicos do norte. Fui-me hidratando e ingerindo os meus géis, regularmente de 7 em 7 kms, a fim de não exaurir as reservas de hidratos de carbono, estratégia imprescindível para não esbarrar com o famoso “muro”.
Em breve atravessei o túnel, onde o meu Garmin se baralhou um pouco, e cheguei à ponte de D. Luís. Depois, em Gaia, colei-me a dois atletas que progrediam a bom ritmo, até chegar ao pórtico da meia-maratona na Afurada. Passei este marco em 1h28’54’’ ainda razoavelmente dentro do plano.
No sentido oposto passei por todos os atletas do Run 4 Fun, com o António sempre à frente do balão das 3h15’. Voltei a passar a ponte D. Luís e foi pouco depois, cerca do quilómetro 28, que o meu verdadeiro sofrimento teve início. As pernas já começavam a dar sinais claros do esforço acumulado, e a ameaçar com a assustadora perspectiva de debilitantes cãibras. Fui forçando o ritmo, concentrando-me nos quilómetros que faltavam: “já só falta um terço da prova… 10 kms… 9 kms…”
Tive várias variações de ritmo, resultado de uma luta constante entre os dois hemisférios do cérebro, um que me mandava abrandar e outro que me ordenava para acelerar.
No regresso da viragem dos 28 km passei pelo António que ainda ia à frente do balão das 3h15’. Pensei, “o António vai em grande ritmo” e mal sabia eu que esse ritmo elevado já só era mantido à custa de uma enorme capacidade de sofrimento.Ritmo Cardíaco em várias provas (Max 175) |
Passei a marca dos 30 km em 2h06’57’’, ainda com uma margem de 25 segundos para atingir o meu objectivo. Aguentei-me num ritmo de cerca de 4’17’’/km (o necessário para conseguir menos de 3 horas dada a margem de que dispunha) até aos 36 kms, procurando apanhar boleia com alguns atletas que me iam ultrapassando.
Quando chegámos à Foz estava estoirado e ainda me faltavam os tão temidos 6 quilómetros finais. Apercebi-me que iria ser muito complicado manter os 4’17’’/km até ao fim. Colei-me a dois atletas dos Falcões Selvagens e esforcei-me por me manter a seu lado. No entanto também eles sentiam o desgaste da prova. Baixei para 4’23’’/km, depois para 4’27’’/km e ainda para 4’29’’/km. Os últimos 2 kms foram feitos em enorme esforço em 4’33’’/km e lá consegui chegar à meta, ao fim de 3h00’53’’.
Assim que parei apercebi-me que não conseguiria correr nem mais 10 metros. Estava exausto, mas feliz apesar de não ter cumprido o objectivo. É como escreveu o António: só se falha quando não tentamos um objectivo suficientemente ambicioso.
Maratona do Porto 2011 |
Depois fui tratar de beber uma cervejinha e esperar pelos companheiros. Lá vi o António chegar às 3h15’ bastante combalido, mas com um excelente resultado que só o pode alegrar. Não pude esperar pelos restantes companheiros, pois tinha que fazer o checkout do Hotel, mas pelos seus relatos pude mais tarde verificar que todos tiraram grande proveito desta excelente 8ª Maratona do Porto.
Recentemente li um livro fascinante, “O filósofo e o lobo”, onde, à luz do que aprendeu com a convivência com um lobo, o autor, Mark Rowlands, se questiona, entre outras coisas, acerca da natureza da felicidade.
Segundo ele, o homo sapiens não vive de forma absoluta o momento presente, mas antes imerso num contínuo que nos mergulha no passado e nos projecta no futuro. O lobo é mais um ser do presente, o qual vive de forma completa e inteira.
Essa imersão no tempo leva-nos muitas vezes a esquecer o valor do processo e focamo-nos apenas no objectivo, que está sempre diferido. No próprio instante em que o cumprimos, esgota-se.
O lobo vive o processo. E os processos mais vitais são os mais viscerais, aqueles que envolvem a maior dose de êxtase, ligada inextrincavelmente com extremos de agonia e desconforto. Por exemplo, quando corremos e damos o nosso máximo, durante várias horas de esforço ininterrupto e esgotante, o que é que sentimos? Sobretudo desconforto, mas também uma enorme exaltação. E sentimos isso tudo em simultâneo. São duas faces da mesma moeda que não são separáveis, experienciadas em uníssono. O que é que fica depois de acabarmos? O principal não é com certeza a marca atingida, mas antes a memória indelével e física do processo de correr.Adidas Adizero Pro 4 |
Esta semana já recomecei os treinos a pensar já na Maratona de Lisboa. A do Porto corri com os meus velhinhos e gastos Adidas Adizero Adios, que me puxaram sobremaneira pelos gémeos (são levezinhos e relativamente planos). Entretanto recebi pelo correio o meu novo modelo, os Adidas Adizero Pro 4, que são ainda mais leves e ainda mais planos. Mal posso esperar para os experimentar!
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