Insanidade nos Tempos de Covid - Estrelaçor 180K - Preâmbulo

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VI Edição

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Estrela Geopark



"A sabedoria é algo que quando nos bate à porta já não nos serve para nada."

- Gabriel Garcia Márquez


(é geralmente isso que me acontece no fim destas provas: ganho a sabedoria suficiente para saber que não me deveria meter nestas aventuras; felizmente ao fim de uma semana já me esqueci novamente...)



"A vida não é o que a gente viveu, e sim o que se lembra e como se lembra para contá-lo."

- Gabriel Garcia Márquez


(e no final desta aventura, espero guardar mais umas excelentes memórias que me durem uma vida; sobretudo porque costumo ter a disciplina de as registar enquanto ainda estão frescas)




Parafraseando despudoradamente:

Era inevitável: o cheiro da terra molhada recordava-me sempre o caminho das provas impossíveis.


E foi assim, que no ano desafortunado da Pandemia, me inscrevi em mais uma odisseia de 100 milhas, a mítica distância do Trail (ou corrida em Trilhos), e aquela que mais prazer (e dor) me dá percorrer.

Arrastado pelo entusiasmo laranjinha dos companheiros RUN 4 FUN, lá coloquei a cruzinha onde estava escrito 180 kms, e pronto, alea jacta est, os dados estão lançados!

 





 


 Lista de inscritos.

 

 

Normalmente sou um sujeito mais timorato, e não me costumo abalançar a uma aventura destas sem garantir os recursos necessários para levar a cabo uma preparação adequada.

Já me coloquei 7 vezes na linha de partida de outros desafios desta magnitude e apenas numa dessas ocasiões não fui feliz.

Mas este ano tem sido tudo menos um ano normal, e portanto, levado por um impulso irresistível, resolvi mandar as minhas reservas às malvas. Que se lixe! Assim sempre tenho um incentivo para começar a treinar à séria, pensei eu.

A 2 de Agosto enviei um email para a Associação O Mundo da Corrida, para que alterassem a minha inscrição dos 100 km para os 180 km do Estrelaçor, a ter lugar no dia 23 de Outubro. Nesse mesmo dia fui para a Serra de Sintra fazer um treino de 42 km para ver se abria a pestana.

Ainda teria 12 semanas pela frente para me preparar para a prova, o que não sendo ideal, deveria ser suficiente caso tudo corresse bem.

Mas como nestas coisas nada é garantido, 4 dias depois caí doente à cama, com febre e mal estar generalizado. A convalescença durou uma semana inteira em que não pude treinar. Nas 3 semanas seguintes consegui apenas fazer treinos curtos, em estrada, sem inclinação.

Desta forma, o meu período de preparação reduziu-se miseravelmente de 12 para 8 semanas, em que as duas últimas serão já necessariamente de abrandamento.

Enfim, faz-se o que se pode com aquilo que se tem. E o que é certo é que as 5 semanas mais recentes têm sido semanas de grande qualidade de treino, com muito desnível acumulado, em Serra, geralmente na companhia do companheiro Rui Faria, e ocasionalmente na do camarada Pedro Ribeiro (cralhes pá!), cujo entusiasmo muito contribuiu para a manutenção de um nível elevado de empenho e motivação.










Neste momento, a cerca de duas semanas da prova, o treino está praticamente feito. Agora o fundamental é não estragar e descansar o suficiente para chegar repousado ao momento da partida.



Comparando as 16 semanas de treino antes do Estrelaçor, com as do AUT (Andorra Ultra Trail) em 2019, e do UTMB (Ultra Trail du Mont Blanc) em 2015, nota-se que o treino de 2015 foi muito mais consistente, e que o de 2019 também teve alguns percalços (também estive doente algumas semanas antes da prova).

Conclusão: se consegui completar os 170K de Ronda Dels Cims, também conseguirei terminar os 180K do Estrelaçor.





Crónica.


Crónica.



Outra variável que é para mim muito importante controlar é o peso. Qualquer kg extra que se carrega na montanha, paga-se mais adiante, quando a prova avança no tempo.

O efeito do confinamento durante a pandemia foi notório, com aumento de peso constante desde Março. Mas à medida que recomecei a treinar fui mais capaz de controlar a ingestão de alimentos e a descida de peso estava a ser sustentada até há cerca de um mês atrás. Gostaria de conseguir perder ainda mais alguns kgs, mas infelizmente nas últimas 5 semanas recuperei 3 kgs.


 

Outra variável que convém controlar é o ritmo cardíaco em repouso. Até há cerca de um mês atrás estava excelente, a 50 bpm. Nas últimas 4 semanas nota-se o acumular do desgaste devido ao grande volume de treino.




E o VO2max (em ml/kg/min) que é uma medida da capacidade de fazer chegar oxigénio aos músculos, ou da quantidade máxima de oxigénio que o corpo consegue consumir..







Enfim, já tenho muita experiência em provas desta dimensão, e espero que isso seja suficiente para colmatar as insuficiencias no treino. Assim conto poder preencher a última linha da seguinte tabelinha com algo mais recompensador do que um DNF (Did Not Finish)








Seja como for, preparei uma tabelinha (amigo Luís Afonso, muito obrigado pelo original!) com passagens conservadoras pelos pontos de abastecimento, para poder controlar a minha progressão no terreno e tentar garantir que consigo chegar ao fim dentro dos tempos limites.

Duas estimativas:

Uma menos conservadora (42 horas):



Outra mais conservadora (48 horas):






A distribuição dos atletas inscritos pelos escalões é a seguinte:


180K


100K


O que mostra bem que 180K são provas para velhos. Na verdade, o mais provavel é entrar em jogo o factor competitividade dos mais novos, uma vez que a prova de 100K é prova Campeonato Nacional de Trail Ultra Endurance.






Este ano a prova terá condições específicas, mercê das restrições do covid, das quais destaco as seguintes:


  • menos bases de vida
  • distribuição de alimentação controlada
  • obrigatório o uso de máscara em locais de ajuntamento de atletas

Vamos ver como nos adaptamos a este admirável novo mundo.






Link para o regulamento do Estrelaçor.


Eis aqui um link para o material aconselhável para uma prova destas (acrescentem a máscara obrigatória...)

Caso permaneçam em solo duro (nesta edição não irá haver), eis aqui um link com conselhos práticos de sobrevivência.



Sobretudo instalem a App do Covid senão ainda são barrados:











Um velho sábio índio disse uma vez:

"Conhece o caminho como a palma da tua mão. Torna-te amigo das pedras, intímo dos troncos, ama os regatos. Escuta o vento, prepara o impermeável para a chuva. 
Poupa-te nas subidas, controla-te nas descidas. Usa os bastões com sabedoria e o papel higiénico com parcimónia. Nos abastecimentos coloca a máscara e aguarda a tua vez.
E sobretudo nunca julgues ninguém antes de percorreres 100 milhas nos seus tenis Kalenji. Assim, meu filho, te tornarás um Trail Runner."



Estou preparado para tudo, até para um dilúvio:





Fonte: windguru



Antes destas provas, ouço muita bravata entre atletas e também muito nervoso miudinho. É natural ter receio que algo corra mal. Desde que esse receio não nos leva à inação.



O medo é teu amigo. 

O medo motiva-te para a ação.

O medo ajuda-te a te preparares.

O medo faz-te sentir vivo.

O medo abre-te oportunidades.

Se não sentires medo é porque não te estás a desafiar o suficiente.

Tu não queres eliminar o medo. O que tu queres é dominar o medo e não ser dominado por ele.







Se necessitarem de partilhar transporte para o local da prova, aconselho publicarem nas vossas redes sociais um texto do género:

"Sou solteiro (divorciado, pronto), às vezes bom rapaz, mas é melhor não contar com isso, bom companheiro quando calha, não sou nem do Benfica nem do Sporting, e não discuto política, a menos que o interlocutor seja demasiado irritante. Ah, e tomo banho (quase) todos os dias..."

 E pronto, vão ver que conseguem logo.



Tenciono pernoitar no Luna Hotel:








Para a prova, inspirem-se nesta foto magnífica:


foto de João Correia



Eis aqui o link para me poderem acompanhar durante a prova, caso não tenham nada interessante para fazer durante todo o fim-de-semana (estou a contar com cerca de, mais ou menos, um seguidor, a menos que a minha mãe tenha mais que fazer...):

LIVE Tracking.



Seja como for, a comitiva RUN 4 FUN irá garantidamente estar acompanhada por este grupo fantástico:




Race Course.



Termo de responsabilidade.

 

Regulamento:

(& plano de contenção)


E lá vou eu:





https://itra.run/race/3945-estrelacor-ultra-endurance-2020-180km&2020


 










Outra coisa que se discute muito antes das provas, é acerca dos benefícios do "carbo loading".

Eu não sou grande crente nas vantagens para quem vai fazer 100 milhas na montanha, mas não descarto algum efeito positivo, sobretudo no troço inicial (30 kms?). Podem consultar este artigo: Carb loading - what is it, when should you do it and why it works

  
"It needs to be something that you focus on for the 48 hours prior to your event starting. It also isn’t eating as much as possible for the two days before your event which will only weigh you down and leave you feeling heavy and bloated."






Vamos lá a ver se o Senhor Presidente da República não nos proíbe de sair à rua até lá...










(anúncio no dia 16/10)


Na noite de sexta-feira dia 16/10, recebemos um email da organização, em que somos notficados da obrigatoriedade de fazer o teste do Covid 48h antes da prova:




 
Lá vou eu levar com a Zaragatoa, que até estala!

Entretanto, de caminho, já marquei também o teste da candidíase e do pé de atleta, não venha a ser exigido...



Mas pelo que vejo no site, a organização fornece serviços de futurologia, para prevermos o resultado da prova. Só não parece estar a ajudar a prever se ela se vai realizar ou não...




Tempos estranhos estes, de facto...





Mas vale a pena consultar o acervo de fotos e vídeo na página do FB da prova:


Vídeos e fotos:

 

 

 

 
 



















































 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
P.S.
 
Porque razão nos sujeitamos a estes limites de desconforto? 

Talvez uma das explicações se encontre nesta história tradicional judaica (que deu origem a uma expressão brasileira: "o bode na sala"), contada por Aaron Zerah em "How the Children Became Stars"
 
The Goat in the room
 
«A poor man lived with his wife and six children in a very small one-room house. They were always getting in each other's way and there was so little space they could hardly breathe!
Finally the man could stand it no more. He talked to his wife and asked her what to do. "Go see the rabbi," she told him, and after arguing a while, he went.

The rabbi greeted him and said, "I see something is troubling you. Whatever it is, you can tell me."

And so the poor man told the rabbi how miserable things were at home with him, his wife, and the six children all eating and living and sleeping in one room. The poor man told the rabbi, "We're even starting to yell and fight with each other. Life couldn't be worse."

The rabbi thought very deeply about the poor man's problem. Then he said, "Do exactly as I tell you and things will get better. Do you promise?"

"I promise," the poor man said.

The rabbi then asked the poor man a strange question. "Do you own any animals?"

"Yes," he said. "I have one cow, one goat, and some chickens."

"Good," the rabbi said. "When you get home, take all the animals into your house to live with you."

The poor man was astonished to hear this advice from the rabbi, but he had promised to do exactly what the rabbi said. So he went home and took all the farm animals into the tiny one-room house.

The next day the poor man ran back to see the rabbi. "What have you done to me, Rabbi?" he cried. "It's awful. I did what you told me and the animals are all over the house! Rabbi, help me!"

The rabbi listened and said calmly, "Now go home and take the chickens back outside."

The poor man did as the rabbi said, but hurried back again the next day. "The chickens are gone, but Rabbi, the goat!" he moaned. "The goat is smashing up all the furniture and eating everything in sight!"
The good rabbi said, "Go home and remove the goat and may God bless you."

So the poor man went home and took the goat outside. But he ran back again to see the rabbi, crying and wailing. "What a nightmare you have brought to my house, Rabbi! With the cow it's like living in a stable! Can human beings live with an animal like this?"

The rabbi said sweetly, "My friend, you are right. May God bless you. Go home now and take the cow out of your house." And the poor man went quickly home and took the cow out of the house.

The next day he came running back to the rabbi again. "O Rabbi," he said with a big smile on his face, "we have such a good life now. The animals are all out of the house. The house is so quiet and we've got room to spare! What a joy!"»



Comentários

  1. aaaah, bem me parecia, pelos ultimos treinos, que andavas a pedir chuva! ehehehe Então muito boa sorte! Lá estarei para a mini kids race, de 46km. Um abraço e bons treinos!

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    1. :D Hehehe... é isso mesmo Filipe!! Preparados para tudo! Então lá nos encontraremos. Também tens feito por aí uns grandes treinos e algumas boas provas, que eu tenho visto. Forte abraço!

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