III Ehunmilak 2012 - 1ª parte
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O 5º e último mesociclo de preparação para o Ehunmilak teve início a 18 de Junho e terminou com a realização da prova (vide preâmbulo).
Neste último período, por indicação do meu treinador, Eduardo Santos, baixei drasticamente o volume de treino, por forma a chegar descansado a Beasain, no País Basco. Confesso que não foi fácil abrandar. Nunca o é, antes de uma prova importante. Para além disso, desde a Ultra de São Mamede (105 km) que não competia em nenhuma prova, o que me deixa sempre um pouco agitado. Tenho necessidade de descarregar a adrenalina. Por outro lado, e contraditoriamente, já me sentia algo fatigado pelo inusitado volume de treino.
Questionava-me: será que treinei de mais, será que treinei de menos? Deveria ter feito algo de forma diferente? Nestas circunstâncias só há uma coisa a fazer: ter confiança no treinador. Até aqui nunca me tinha dado mal.
Aliás, a questão inicial passa logo pelo objectivo a estabelecer: será demasiado ambicioso, será pouco? É a eterna dúvida do ser humano e do atleta em particular: “Ser ou não ser?”
Enfim, parti para Espanha com a confiança de quem tinha planeado um objectivo ambicioso mas atingível por um corpo endurecido e uma alma preparada. Sempre tinham sido 5 meses de treino duro e sistemático, caramba!
Parti com toda a família, apoiantes indefectíveis, companhia permanente e bálsamo revigorante, nestas empreitadas “maiores que a vida.”
Chegámos a Alsasua (Altsasu em Basco), na Navarra, a 26 km de Beasain, centro logístico da prova, na 4ª feira dia 11 de Junho.
Tinhamos alugado um agradável apartamento, geminado com outro onde se acomodaria a família do companheiro de aventura, Luís Freitas, que chegaria no dia seguinte.
Seria esta a nossa base operacional durante as 6 noites que iríamos permanecer pelo nordeste espanhol.
Na 5ª feira, para descomprimir, aproveitámos para fazer turismo por Donostia / S. Sebastian, que é uma cidade lindíssima, junto ao mar. Ainda molhámos os pés na surpreendentemente quente água da belissima praia, localizada na baia.
À tarde fomos visitar Larraitz, na base do monte Txindoki (1346 m). Este monte para além de ex-libris da prova, iria ser um dos maiores obstáculos a ultrapassar.
Os miúdos divertiram-se imenso num parque aventura, onde fizeram slide, entre outras actividades.
Às 18h30 encontrámo-nos em Beasain com a família Freitas e levantámos os dorsais. Para os levantar, foi necessário apresentar o material obrigatório para a prova. Este consistia em:
• BI
• Mochila (levei a Salomon XT Skin Pro)
• Reservatório de água com capacidade para 1 litro (a mochila tem um reservatorio de 1,5 l)
• Reserva de comida (não indicavam a quantidade de calorias, mas eu levei 10 géis de 40 g cada, o que totaliza cerca de 1000 Kcal)
• Corta-vento impermeável (este item foi sempre o meu maior receio, dada a minha inexperiência com provas noturnas – de noite nunca tinha corrido mais do que 2 horas)
• Calças abaixo do joelho
• 2 frontais com pilhas de reserva
• Cobertor de sobrevivência
• Chapéu
• Apíto
• Ligadura adesiva (esta deu-me trabalho a encontrar nas farmácias)
• Telemóvel
Levei ainda:
• Camisola térmica de mangas compridas
• Luvas
• Gorro
• Bastões (fundamentais para este tipo de prova)
Após a verificação, a organização prendeu-nos o chip no pulso, forneceu-nos o dorsal (número 19) e um livrinho muito jeitoso com todas as 16 etapas entre abastecimentos e respectiva altimetria e diversas senhas para vários fins.
Ao voltarmos para o carro, cruzamo-nos alegremente com vários dos elementos do grande contingente português.
Na 6ª feira dormi até às 10 horas (locais), tentando acumular o maior número de horas de sono possíveis. Acordei bem disposto e ansioso porque a prova tivesse início. Tanto eu como o Luís resolvemos não comparecer na Pasta-Party a fim de descansarmos o máximo possível até à hora de partida. Pela minha parte, comi uma pratada de esparguete tão bem fornida que até senti as artérias a entupirem com tamanha quantidade de hidratos de carbono.
No dia anterior a temperatura tinha estado muito alta, mas nós sabíamos que a previsão para esta noite seria de chuva e baixa drástica de temperatura, logo ataviamos a mochila com o material necessário para enfrentar estas condições (no meu caso, corta vento, camisola térmica de mangas compridas, gorro e luvas).
Às 16 horas metemo-nos nos automóveis e saímos em direção a Beasain, com ânimo nos corações e agitação nos pés.
Prespassa pela minha cabeça a lista de material obrigatório e de súbito apercebo-me: esqueci-me dos bastões! Tenho que voltar para trás para os ir buscar. Nem me passa pela cabeça prescindir deles.
Ultrapassado este pequeno contratempo, voltamos à estrada. Chegamos a Beasain, estacionamos e vamos entregar os 3 sacos com as mudas de roupa: um para o km 77 em Tolosa, outro para o km 130 em Etxegarate e o último para a chegada a Beasain.
Vamos encontrando a totalidade da comitiva portuguesa, e tiramos fotos de conjunto, para a posteridade.
São 12 destemidos homens e uma valorosa mulher, estes que tiveram a coragem de alinhar na partida e se preparam para enfrentar um dos maiores desafios da sua vida desportiva:
#9 José Morgado
#13 Vitorino Coragem
#19 Luis Ferreira
#32 Luis Freitas
#39 Paulo Costa
#68 José Sá
#84 Daniel Junior
#193 Nuno Silva
#194 Teresa Afonso
#202 Luís Mota
#316 José Simões
#317 Cirilo Santos
#318 Carlos Couto
Pouco depois das 17 horas entramos no recinto fechado em frente à sede da Autarquia. Passamos o chip pelo mecanismo de registo e apontam o nosso número numa folha de papel (usaram sempre estes dois métodos para prevenir falhas no sistema).
Conversamos entre nós. O Paulo Costa confidencia-me que tem uma lesão na perna desde o MIUT (feito recentemente), mas que está esperançoso que esta não o impeça de prosseguir. É um sinal de grande coragem, enfrentar uma prova desta natureza nessas condições!
Para surpresa minha, o Luís Mota também vai participar. Este homem é imparável! Semana após semana atínge belissimos resultados em duras provas.
O Vitorino Coragem está igual a si mesmo: comunicativo e entusiasmado com a participação na prova. Tem razões para estar: efectuou um preparação muito intensa para estar aqui a 200%.
O Luís Freitas está irrequieto, mas isso nele é normal antes das provas e passa-lhe logo assim que começa a correr. Recentemente sofreu uma lesão que lhe prejudicou muito a preparação para esta prova. No entanto estou certo que lhe irá correr de feição, pois, mercê da nossa participação conjunta em várias provas, já lhe conheço o espírito combativo e dúvido que se deixe esmorecer.
Os minutos escorrem lentos. O ar está quente e abafado, pressagiando tempestade. A ansiedade e a adrenalina são palpáveis no ar. Cheira a testosterona ... e a medo.
5... 4... 3... 2... 1... é dada a partida!!!
187 atletas correm entusiasmados pelas ruas de Beasain, emoldurados por uma mui entusiástica mole humana. Parece uma largada de touros. Uns partem lentos, outros muito céleres.
À saída da Vila encontramos a primeira subida onde somos saudados por um burro que zurra, ataviado com o lenço das festas de San Firmin de Pamplona. Há logo quem questione divertido: “e o burro sou eu?” O proverbial sentido de humor português faz-se sentir nas mais longínquas paragens...
Vou decidido a andar em todas as subidas, no que sou acompanhado pelo Luís Freitas e pelo Paulo Costa. Nas descidas aproveitarei para tomar balanço e acelerar. Mas mesmo isso apenas durou os quilómetros iniciais, após os quais resolvo adoptar uma postura mais defensiva, aproveitando para descer correndo mas com maior precaução. Não convém rebentar já com os músculos quadricípites que muita falta me irão fazer durante a prova.
A primeira subida é uma originalidade introduzida no percurso deste ano. Nenhuma das duas primeiras edições tinha passado por um ponto alto de Beasain. A organização decidiu alterar esse estado de coisas fazendo-nos passar pelo Usurbe (707 m) na Serra de Murumendi. Essa primeira subida deu logo para aferir parte daquilo que nos esperava: subidas com inclinações ferocíssimas, seguidas de descidas abruptas como precipícios! Nos primeiros 5 km subimos logo cerca 800 metros! Passou-me pela mente que em Portugal já tinha participado em Trails de 30 km com pouco mais desnível positivo do que isto!
Até este ponto ainda não chovia, e ao fim de 10 km chegámos ao 1º abastecimento (K1 – supostamente apenas líquidos), em Mandubia (548 m de altitide), tendo feito 1050 m D+ (desnível positivo) e 600 m D- (desnível negativo) em 1h20. Depois arrancámos para a etapa seguinte, que nos levaria até Zumarraga, passando pelo monte Izazpi (967 m) no km 15.
A descida para Zumarraga é agressiva e há que ter cuidado, sobretudo porque já começou a chuviscar e o terreno irá progressivamente ficando mais escorregadio. Sigo atrás do Luís Freitas e após uns 600 m de D- lá chegamos à vila, 2h54 de prova decorridas, e aproximamo-nos do pavilhão onde se encontra o abastecimento K2. Somos aplaudidos e incentivados pela grande quantidade de publico que se encontra nas ruas, o que, aliás, foi uma constante de toda a prova. Pudera em Portugal ocorrer o mesmo! Tenho a grande alegria de passar pela minha família (e a do Freitas) que nos veio animar.
Entramos no pavilhão onde aproveito para repousar um pouco e ingerir alimento sólido.
Os abastecimentos são muito bem providos: consistem em fruta fresca à discrição - melão, melancia, laranja, banana - tomate com sal, frutos secos, bolos secos de vários tipos, sopa, chouriça, pão, fiambre, queijo, coca-cola, sumos, café.
O Luís não deseja prolongar as suas paragens nos abastecimentos, a fim de não arrefecer os musculos, e portanto arranca célere. Ao fim de uns minutos lá o sigo, mas já o perdi de vista. Chegado cá fora, dada a chuva miudinha e o arrefecimento significativo, decido vestir a minha camisola térmica de mangas compridas. Sinto-me bem melhor, mas assim que alcanço a primeira subida íngreme, volto a aquecer.
Este é um problema constante: vestir, despir, consoante a variação do ritmo, do esforço, da temperatura e do vento. Tanto suo em bica, como arrefeço repentinamente. É uma gestão difícil de conseguir.
Subo por um caminho muito inclinado no meio de uma floresta mais densa. Uma subida de cerca de 4 km levou-me até ao alto do Irimo (901 m). Sou ultrapassado por um casal jovem que sobe rápido que nem cabras montesas! Onde é que estes Bascos vão buscar toda esta energia?! Quando começo a descer sinto a necessidade de ligar o frontal pois a noite está a cair e já não vejo praticamente nada. Não há luar (é quase lua nova) e o céu está encoberto.
Apesar do meu Petzl Myo RXP de 140 lumens alumiar o caminho como se fora os faróis de um automóvel, ao início sinto dificuldade em localizar as fitas reflectoras na descida muito inclinada em que vou progredindo. Tenho receio de descer por ali abaixo ao engano e depois ter necessidade de subir tudo novamente para voltar ao trilho correcto. No entanto, apesar da falta de experiência, lá me vou orientando, conforme posso. Verdade seja dita, o percurso está muito bem marcado e não tenho reparos a colocar nesse aspecto. As diculdades surgem sobretudo devido à chuva e ao nevoeiro que se fará sentir nos pontos mais altos.
Às 22h34 (4h34 de prova), noite cerrada, lá chego ao abastecimento de Gorla (668 m), percorridos os primeiros 29 km e tendo começado a minha adaptação à corrida noturna.
Mal sabia eu o que ainda me esperava pela frente...
to be continued...
Recinto da partida |
O 5º e último mesociclo de preparação para o Ehunmilak teve início a 18 de Junho e terminou com a realização da prova (vide preâmbulo).
Neste último período, por indicação do meu treinador, Eduardo Santos, baixei drasticamente o volume de treino, por forma a chegar descansado a Beasain, no País Basco. Confesso que não foi fácil abrandar. Nunca o é, antes de uma prova importante. Para além disso, desde a Ultra de São Mamede (105 km) que não competia em nenhuma prova, o que me deixa sempre um pouco agitado. Tenho necessidade de descarregar a adrenalina. Por outro lado, e contraditoriamente, já me sentia algo fatigado pelo inusitado volume de treino.
Questionava-me: será que treinei de mais, será que treinei de menos? Deveria ter feito algo de forma diferente? Nestas circunstâncias só há uma coisa a fazer: ter confiança no treinador. Até aqui nunca me tinha dado mal.
Aliás, a questão inicial passa logo pelo objectivo a estabelecer: será demasiado ambicioso, será pouco? É a eterna dúvida do ser humano e do atleta em particular: “Ser ou não ser?”
Enfim, parti para Espanha com a confiança de quem tinha planeado um objectivo ambicioso mas atingível por um corpo endurecido e uma alma preparada. Sempre tinham sido 5 meses de treino duro e sistemático, caramba!
Parti com toda a família, apoiantes indefectíveis, companhia permanente e bálsamo revigorante, nestas empreitadas “maiores que a vida.”
Família |
Chegámos a Alsasua (Altsasu em Basco), na Navarra, a 26 km de Beasain, centro logístico da prova, na 4ª feira dia 11 de Junho.
Tinhamos alugado um agradável apartamento, geminado com outro onde se acomodaria a família do companheiro de aventura, Luís Freitas, que chegaria no dia seguinte.
Seria esta a nossa base operacional durante as 6 noites que iríamos permanecer pelo nordeste espanhol.
Na 5ª feira, para descomprimir, aproveitámos para fazer turismo por Donostia / S. Sebastian, que é uma cidade lindíssima, junto ao mar. Ainda molhámos os pés na surpreendentemente quente água da belissima praia, localizada na baia.
San Sebastian / Donostia |
À tarde fomos visitar Larraitz, na base do monte Txindoki (1346 m). Este monte para além de ex-libris da prova, iria ser um dos maiores obstáculos a ultrapassar.
Txindoki |
Os miúdos divertiram-se imenso num parque aventura, onde fizeram slide, entre outras actividades.
Os miúdos com o Txindoki em fundo |
Às 18h30 encontrámo-nos em Beasain com a família Freitas e levantámos os dorsais. Para os levantar, foi necessário apresentar o material obrigatório para a prova. Este consistia em:
• BI
• Mochila (levei a Salomon XT Skin Pro)
• Reservatório de água com capacidade para 1 litro (a mochila tem um reservatorio de 1,5 l)
• Reserva de comida (não indicavam a quantidade de calorias, mas eu levei 10 géis de 40 g cada, o que totaliza cerca de 1000 Kcal)
• Corta-vento impermeável (este item foi sempre o meu maior receio, dada a minha inexperiência com provas noturnas – de noite nunca tinha corrido mais do que 2 horas)
• Calças abaixo do joelho
• 2 frontais com pilhas de reserva
• Cobertor de sobrevivência
• Chapéu
• Apíto
• Ligadura adesiva (esta deu-me trabalho a encontrar nas farmácias)
• Telemóvel
Levei ainda:
• Camisola térmica de mangas compridas
• Luvas
• Gorro
• Bastões (fundamentais para este tipo de prova)
Após a verificação, a organização prendeu-nos o chip no pulso, forneceu-nos o dorsal (número 19) e um livrinho muito jeitoso com todas as 16 etapas entre abastecimentos e respectiva altimetria e diversas senhas para vários fins.
Ao voltarmos para o carro, cruzamo-nos alegremente com vários dos elementos do grande contingente português.
Na 6ª feira dormi até às 10 horas (locais), tentando acumular o maior número de horas de sono possíveis. Acordei bem disposto e ansioso porque a prova tivesse início. Tanto eu como o Luís resolvemos não comparecer na Pasta-Party a fim de descansarmos o máximo possível até à hora de partida. Pela minha parte, comi uma pratada de esparguete tão bem fornida que até senti as artérias a entupirem com tamanha quantidade de hidratos de carbono.
No dia anterior a temperatura tinha estado muito alta, mas nós sabíamos que a previsão para esta noite seria de chuva e baixa drástica de temperatura, logo ataviamos a mochila com o material necessário para enfrentar estas condições (no meu caso, corta vento, camisola térmica de mangas compridas, gorro e luvas).
Às 16 horas metemo-nos nos automóveis e saímos em direção a Beasain, com ânimo nos corações e agitação nos pés.
Prespassa pela minha cabeça a lista de material obrigatório e de súbito apercebo-me: esqueci-me dos bastões! Tenho que voltar para trás para os ir buscar. Nem me passa pela cabeça prescindir deles.
Ultrapassado este pequeno contratempo, voltamos à estrada. Chegamos a Beasain, estacionamos e vamos entregar os 3 sacos com as mudas de roupa: um para o km 77 em Tolosa, outro para o km 130 em Etxegarate e o último para a chegada a Beasain.
Vamos encontrando a totalidade da comitiva portuguesa, e tiramos fotos de conjunto, para a posteridade.
Contingente Luso |
São 12 destemidos homens e uma valorosa mulher, estes que tiveram a coragem de alinhar na partida e se preparam para enfrentar um dos maiores desafios da sua vida desportiva:
#9 José Morgado
#13 Vitorino Coragem
#19 Luis Ferreira
#32 Luis Freitas
#39 Paulo Costa
#68 José Sá
#84 Daniel Junior
#193 Nuno Silva
#194 Teresa Afonso
#202 Luís Mota
#316 José Simões
#317 Cirilo Santos
#318 Carlos Couto
Pouco depois das 17 horas entramos no recinto fechado em frente à sede da Autarquia. Passamos o chip pelo mecanismo de registo e apontam o nosso número numa folha de papel (usaram sempre estes dois métodos para prevenir falhas no sistema).
Conversamos entre nós. O Paulo Costa confidencia-me que tem uma lesão na perna desde o MIUT (feito recentemente), mas que está esperançoso que esta não o impeça de prosseguir. É um sinal de grande coragem, enfrentar uma prova desta natureza nessas condições!
Para surpresa minha, o Luís Mota também vai participar. Este homem é imparável! Semana após semana atínge belissimos resultados em duras provas.
O Vitorino Coragem está igual a si mesmo: comunicativo e entusiasmado com a participação na prova. Tem razões para estar: efectuou um preparação muito intensa para estar aqui a 200%.
O Luís Freitas está irrequieto, mas isso nele é normal antes das provas e passa-lhe logo assim que começa a correr. Recentemente sofreu uma lesão que lhe prejudicou muito a preparação para esta prova. No entanto estou certo que lhe irá correr de feição, pois, mercê da nossa participação conjunta em várias provas, já lhe conheço o espírito combativo e dúvido que se deixe esmorecer.
Antes da partida - Foto de José Morgado |
Os minutos escorrem lentos. O ar está quente e abafado, pressagiando tempestade. A ansiedade e a adrenalina são palpáveis no ar. Cheira a testosterona ... e a medo.
5... 4... 3... 2... 1... é dada a partida!!!
187 atletas correm entusiasmados pelas ruas de Beasain, emoldurados por uma mui entusiástica mole humana. Parece uma largada de touros. Uns partem lentos, outros muito céleres.
Partida |
À saída da Vila encontramos a primeira subida onde somos saudados por um burro que zurra, ataviado com o lenço das festas de San Firmin de Pamplona. Há logo quem questione divertido: “e o burro sou eu?” O proverbial sentido de humor português faz-se sentir nas mais longínquas paragens...
Vou decidido a andar em todas as subidas, no que sou acompanhado pelo Luís Freitas e pelo Paulo Costa. Nas descidas aproveitarei para tomar balanço e acelerar. Mas mesmo isso apenas durou os quilómetros iniciais, após os quais resolvo adoptar uma postura mais defensiva, aproveitando para descer correndo mas com maior precaução. Não convém rebentar já com os músculos quadricípites que muita falta me irão fazer durante a prova.
Luís Freitas comigo na sua peugada |
A primeira subida é uma originalidade introduzida no percurso deste ano. Nenhuma das duas primeiras edições tinha passado por um ponto alto de Beasain. A organização decidiu alterar esse estado de coisas fazendo-nos passar pelo Usurbe (707 m) na Serra de Murumendi. Essa primeira subida deu logo para aferir parte daquilo que nos esperava: subidas com inclinações ferocíssimas, seguidas de descidas abruptas como precipícios! Nos primeiros 5 km subimos logo cerca 800 metros! Passou-me pela mente que em Portugal já tinha participado em Trails de 30 km com pouco mais desnível positivo do que isto!
Beasain com o Txindoki em fundo - Foto de José Morgado |
Até este ponto ainda não chovia, e ao fim de 10 km chegámos ao 1º abastecimento (K1 – supostamente apenas líquidos), em Mandubia (548 m de altitide), tendo feito 1050 m D+ (desnível positivo) e 600 m D- (desnível negativo) em 1h20. Depois arrancámos para a etapa seguinte, que nos levaria até Zumarraga, passando pelo monte Izazpi (967 m) no km 15.
A descida para Zumarraga é agressiva e há que ter cuidado, sobretudo porque já começou a chuviscar e o terreno irá progressivamente ficando mais escorregadio. Sigo atrás do Luís Freitas e após uns 600 m de D- lá chegamos à vila, 2h54 de prova decorridas, e aproximamo-nos do pavilhão onde se encontra o abastecimento K2. Somos aplaudidos e incentivados pela grande quantidade de publico que se encontra nas ruas, o que, aliás, foi uma constante de toda a prova. Pudera em Portugal ocorrer o mesmo! Tenho a grande alegria de passar pela minha família (e a do Freitas) que nos veio animar.
Zumarraga - Entrada no pavilhão |
Entramos no pavilhão onde aproveito para repousar um pouco e ingerir alimento sólido.
Os abastecimentos são muito bem providos: consistem em fruta fresca à discrição - melão, melancia, laranja, banana - tomate com sal, frutos secos, bolos secos de vários tipos, sopa, chouriça, pão, fiambre, queijo, coca-cola, sumos, café.
O Luís não deseja prolongar as suas paragens nos abastecimentos, a fim de não arrefecer os musculos, e portanto arranca célere. Ao fim de uns minutos lá o sigo, mas já o perdi de vista. Chegado cá fora, dada a chuva miudinha e o arrefecimento significativo, decido vestir a minha camisola térmica de mangas compridas. Sinto-me bem melhor, mas assim que alcanço a primeira subida íngreme, volto a aquecer.
Este é um problema constante: vestir, despir, consoante a variação do ritmo, do esforço, da temperatura e do vento. Tanto suo em bica, como arrefeço repentinamente. É uma gestão difícil de conseguir.
Subida - foto da organização |
Subo por um caminho muito inclinado no meio de uma floresta mais densa. Uma subida de cerca de 4 km levou-me até ao alto do Irimo (901 m). Sou ultrapassado por um casal jovem que sobe rápido que nem cabras montesas! Onde é que estes Bascos vão buscar toda esta energia?! Quando começo a descer sinto a necessidade de ligar o frontal pois a noite está a cair e já não vejo praticamente nada. Não há luar (é quase lua nova) e o céu está encoberto.
Noite - foto da organização |
Apesar do meu Petzl Myo RXP de 140 lumens alumiar o caminho como se fora os faróis de um automóvel, ao início sinto dificuldade em localizar as fitas reflectoras na descida muito inclinada em que vou progredindo. Tenho receio de descer por ali abaixo ao engano e depois ter necessidade de subir tudo novamente para voltar ao trilho correcto. No entanto, apesar da falta de experiência, lá me vou orientando, conforme posso. Verdade seja dita, o percurso está muito bem marcado e não tenho reparos a colocar nesse aspecto. As diculdades surgem sobretudo devido à chuva e ao nevoeiro que se fará sentir nos pontos mais altos.
Às 22h34 (4h34 de prova), noite cerrada, lá chego ao abastecimento de Gorla (668 m), percorridos os primeiros 29 km e tendo começado a minha adaptação à corrida noturna.
Mal sabia eu o que ainda me esperava pela frente...
to be continued...
Entusiasmante relato. Estou ansioso por "ouvir" o resto.
ResponderEliminarFantástica aventura Luis e ainda agora começou.
ResponderEliminarO lugar aspira a grandes feitos e fotografias.
Fico á espera do que falta.
NDA
Já começa a doer. És um grandes campeão.
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