EMUM - Eco Madeira Ultra Maratona 2016
Views
Agora é que estou a pouco mais de um terço da prova, com 60 km percorridos e 2.700 mD+. Neste ponto ainda estão todos os atletas em prova e eu continuo em 16º de um total de 19.
Desisto da massagem e sou transportado até ao hotel no carro de um voluntário.
“Passamos a grande Ilha da Madeira,
Que do muito arvoredo assim se chama,
Das que nós povoamos, a primeira,
Mais célebre por nome que por fama:
Mas nem por ser do mundo a derradeira
Se lhe aventajam quantas Vénus ama,
Antes, sendo esta sua, se esquecera
De Cipro, Gnido, Pafos e Citera.
Que do muito arvoredo assim se chama,
Das que nós povoamos, a primeira,
Mais célebre por nome que por fama:
Mas nem por ser do mundo a derradeira
Se lhe aventajam quantas Vénus ama,
Antes, sendo esta sua, se esquecera
De Cipro, Gnido, Pafos e Citera.
“Os Lusiadas”, Canto V – Estância 5
Luis de Camões
Luis de Camões
Arquipélago da Madeira
Arquipélago (pop. est.: 300 000), 798 km²; capital: Funchal; país: Portugal, estatuto: Região Autónoma.
Situado no oceano Atlântico a cerca de 560 km da costa de Marrocos, o arquipélago da Madeira é formado pelas ilhas da Madeira, a maior, e Porto Santo, ambas habitadas, além das Desertas e das Selvagens (estas um pouco mais próximas de África), dois pequenos grupos de ilhas não povoadas. Conhecidas pelos Romanos como "Ilhas da Púrpura", Porto Santo e a Madeira foram redescobertas no século XV por navegadores ao serviço do Infante D. Henrique.
As origens vulcânicas da Madeira permanecem bem visíveis em locais como o anfiteatro montanhoso que envolve o Funchal, vestígio de uma antiga caldeira. A ilha é extremamente acidentada, com picos que atingem os 1860 m de altitude. Felizmente para os turistas, a actividade vulcânica cessou há cerca de 6500 anos – contudo, foi essa actividade que dotou a ilha de uma paisagem fértil, formada até recentemente por um importante manto de antigas florestas subtropicais que esteve na origem do seu nome – Madeira.
Nas encostas do norte da ilha permanecem bem preservadas algumas áreas dessa antiga floresta (laurissilva), hoje classificadas como Património Mundial pela UNESCO. No entanto, as soberbas flores que deram fama à Madeira podem ser apreciadas em todo o território e durante todo o ano. Uma das melhores formas de contemplar as soberbas paisagens é fazer um passeio pelas levadas – caminhos que seguem junto aos canais que outrora irrigavam as áreas mais secas.
A Madeira é um encantador destino turístico durante todo o ano, e embora seja importante a produção de bananas, de cana-de-açúcar e de Vinho da Madeira, grande parte do seu crescimento económico deveu-se ao turismo. O norte permanece essencialmente rural, enquanto o sul, sobretudo no Funchal e áreas vizinhas, tem vindo a crescer proporcionando acolhimento aos turistas mais exigentes. Muitos dos melhores hotéis da ilha encontram-se nesta área.
Arquipélago (pop. est.: 300 000), 798 km²; capital: Funchal; país: Portugal, estatuto: Região Autónoma.
Situado no oceano Atlântico a cerca de 560 km da costa de Marrocos, o arquipélago da Madeira é formado pelas ilhas da Madeira, a maior, e Porto Santo, ambas habitadas, além das Desertas e das Selvagens (estas um pouco mais próximas de África), dois pequenos grupos de ilhas não povoadas. Conhecidas pelos Romanos como "Ilhas da Púrpura", Porto Santo e a Madeira foram redescobertas no século XV por navegadores ao serviço do Infante D. Henrique.
As origens vulcânicas da Madeira permanecem bem visíveis em locais como o anfiteatro montanhoso que envolve o Funchal, vestígio de uma antiga caldeira. A ilha é extremamente acidentada, com picos que atingem os 1860 m de altitude. Felizmente para os turistas, a actividade vulcânica cessou há cerca de 6500 anos – contudo, foi essa actividade que dotou a ilha de uma paisagem fértil, formada até recentemente por um importante manto de antigas florestas subtropicais que esteve na origem do seu nome – Madeira.
Nas encostas do norte da ilha permanecem bem preservadas algumas áreas dessa antiga floresta (laurissilva), hoje classificadas como Património Mundial pela UNESCO. No entanto, as soberbas flores que deram fama à Madeira podem ser apreciadas em todo o território e durante todo o ano. Uma das melhores formas de contemplar as soberbas paisagens é fazer um passeio pelas levadas – caminhos que seguem junto aos canais que outrora irrigavam as áreas mais secas.
A Madeira é um encantador destino turístico durante todo o ano, e embora seja importante a produção de bananas, de cana-de-açúcar e de Vinho da Madeira, grande parte do seu crescimento económico deveu-se ao turismo. O norte permanece essencialmente rural, enquanto o sul, sobretudo no Funchal e áreas vizinhas, tem vindo a crescer proporcionando acolhimento aos turistas mais exigentes. Muitos dos melhores hotéis da ilha encontram-se nesta área.
“No man is an
Island, entire of itself; every man is a piece of the Continent, a part of the
main; if a clod be washed away by the sea, Europe is the less, as well as if a
promontory were, as well as if a manor of thy friends or of thine own were; any
man's death diminishes me, because I am involved in Mankind; And therefore
never send to know for whom the bell tolls; It tolls for thee.”
- John Donne, Meditation
XVII
"Don't part with your
illusions. When they are gone, you may still exist, but you have ceased to
live."
- Mark Twain
Dar a volta a uma
ilha…
É uma espécie de
sonho de criança.
Uma volta
completa a uma ilha.
E que ilha! A
magnífica, imponente, selvagem, Ilha da Madeira! Com suas falésias escarpadas
que nos atiram do alto para o abismo do mar profundo.
Com suas rugas
profundas de lava ardente e seus jardins luxuriantes batidos a bátegas de água
abundante.
Um desafio destes
não se recusa.
Assim que me foi
apresentado pelo meu amigo João Colaço, aceitei logo.
Este ano ainda
não tinha cumprido a obrigatória prova de 100 milhas e esta vinha mesmo a
calhar.
Para mais com o
aliciante da companhia dos amigos e companheiros de viagem João Mota e Paulo
Osório.
E foi mesmo com
eles que parti na madrugada de quinta-feira dia 24/11, no avião da easyJet, voo
das 7h00. Levámos apenas uma mala de porão, que partilhámos entre os três, para
colocarmos algum material extra e sobretudo os bastões, que iriam fazer muita falta
durante a prova.
O voo decorreu sem incidentes. À chegada deparámos com o Lino Luz, que também estava inscrito.
Apanhámos juntos o
Aerobus que nos deixou no 3º apeadeiro, praticamente defronte ao Hotel
Residencial Parque, no centro do Funchal, onde pernoitámos as 4 noites da
estadia.
Quarto simples,
mas com as comodidades suficientes para três aventureiros.
Fomos a Câmara de
Lobos buscar os dorsais e os sacos das duas mudas de roupa e aproveitámos para
almoçar uma belíssimas lapas e peixe-espada preto com batata-doce.
Passeio e Jantar
frugal de esparguete carbonara. Às 23h00 já estava no quarto a dormir.
Uma noite
repousante, das melhores que tive nos últimos tempos e acordei mesmo a tempo de
tomar o pequeno-almoço às 10h00, juntando-me aos companheiros.
Novo almoço de
esparguete e voltámos para a residencial a fim de preparar os sacos e o
equipamento.
Às 15h30
estávamos no local de partida, na Promenade do Funchal, Avenida do Mar, Praça
do Povo.
Os restantes
atletas encontravam-se por lá. Cumprimentei efusivamente o Alexandre Cunha e o
Paulo Costa, companheiros de inúmeras destas aventuras, ao longo dos últimos
anos.
O Nuno Gonçalves
fez o briefing para os 19 atletas que alinham à partida, 18 homens e uma única
mulher.
Idades
compreendidas entre os 23 anos do mais novo e os 55 do mais velho.
São agora 16h00 e
é dada a partida. Somos encaminhados para fora da cidade pelo Ilídio que nos
deixa à saída. A partir daí estamos por nossa conta. O tempo por enquanto está
quente e solarengo. No entanto as previsões apontam para chuva forte durante a
noite.
Como diz o povo,
“enquanto o pau vai e vem folgam as costas,” portanto há que andar depressa
enquanto podemos.
Os primeiros 8 km
até ao Caniço são percorridos em grupo em pouco menos de uma hora. O percurso é
maioritariamente por alcatrão ou empedrado, mas a vista é magnífica. Os atletas
começam a dispersar-se. Uns avançam mais rápido, outros mais vagarosos (eu incluído).
Passo pelo aeroporto ao entardecer. A descida para Machico já é feita de noite. É a primeira de muitas descidas que serão feitas por umas escadarias típicas na Madeira, extremamente escorregadias quando molhadas, devido ao musgo e às características da pedra e do cimento utilizado.
Primeiro
abastecimento de sólidos aos 15,6 km. Chego lá com 03:00:33 decorridos. Estou
em 16º lugar. O João Oliveira já aqui passou faz 45 minutos. É uma máquina
aquele rapaz!
O João e o Paulo
levam-me 20 minutos de avanço. O Alexandre Costa e o Paulo Cunha saíram há 5
minutos.
Agora vamos
atravessar a cordilheira para conseguirmos aceder à costa norte da Ilha. Tal
como Aníbal atravessou os Alpes com o seu exército assim vamos nós correr de
encontro ao nosso destino.
De noite a progressão é mais difícil. As fitas
são daquelas vermelhas e brancas não refletoras, e as setas verdes no chão não
são fáceis de ver durante a noite. Para além de que algumas foram nitidamente
raspadas pelas populações locais, pouco habituadas a este ipo de evento
desportivo.
Seja como for,
perco-me apenas 3 ou 4 vezes, nunca por demasiado tempo pois volto atrás até
reencontrar o caminho. Estas contrariedades fazem parte do desafio e saber
ultrapassá-las sem desmoralizar é uma característica essencial de um Trail
Runner bem-sucedido.
Por mais que
planeemos uma prova ao mínimo detalhe, vão ocorrer sempre vários eventos
inesperados, que podem deitar tudo a perder caso não saibamos lidar com eles
adequadamente.
É isso mesmo que
torna o Ultra Endurance uma modalidade fascinante que exige uma enorme
disciplina e resiliência mental. Em todas as 5 provas de mais de 100 milhas que
já concluí, tive que enfrentar enormes desafios que não tinha previsto. E foi o
ultrapassar desses desafios que me fez saborear o sucesso do desafio concluído como
uma enorme vitória.
Desde lesões que
surgem na véspera, até meias mal escolhidas que estropiam os pés, quedas
aparatosas ou incapacidade de ingerir alimento, tudo nos pode levar a desanimar
caso não mantenhamos a fé.
E mesmo que a fé não mova as montanhas,
certamente nos move para além delas.
Assim sendo, eram
21h24 quando finalmente cheguei a Porto da Cruz. Abastecimento sem história.
Todos eles são iguais, exceto os dois das mudas de roupa. Bananas, gomos de
laranja, batata frita, chocolate, barritas, passas, queijo, água, coca-cola e
um isotónico muito aguado.
Mesmo sabendo que
pode ser deletério para o meu estomago, dada a acidez que a caracteriza, passo
o tempo a beber coca-cola, pelo açúcar a pela cafeína.
Como tudo o que
consigo e avanço para noite. Vamos agora percorrer a costa norte da ilha.
Agora é a subida
para Santana onde vou chegar às 01h39, com 47 km de prova feitos e 2.100 mD+.
ainda não é um terço de prova mas já é qualquer coisa. É aqui que está a
primeira muda de roupa e a primeira canja quentinha. A canja é uma maravilha, cheia
de carne e massa. Vale a pena repetir. Quanto à roupa, não altero nada.
Coloquei um
power-bank em cada saco de muda de roupa para carregar o Sunnto. Contudo,
reparo agora que me esqueci da pinça para carregar o relógio. Ora bolas! Vai
dar para apenas 10h de GPS. Depois fico às escuras.
Saio reconfortado
e lanço-me em mais uma daquelas descidas híper-escorregadias que percorro muito
cautelosamente ao ritmo de um elefante obstipado. Após duas ou três quedas
felizmente sem gravidade, a minha velocidade desce para sub-vegetal, quase mineral.
Subo para S.
Jorge e prossigo em direção a Arco de S. Jorge onde chego após 11:00:33 de
prova. São 3 da madrugada e a noite nunca mais acaba.
Agora é que estou a pouco mais de um terço da prova, com 60 km percorridos e 2.700 mD+. Neste ponto ainda estão todos os atletas em prova e eu continuo em 16º de um total de 19.
Chega o atleta
mais velho, o José Nunes que me diz que o tempo de corte do próximo
abastecimento é às 6h da manhã. Pela primeira vez numa prova me preocupo com o
tempo de corte. Tenho que percorrer os próximos 13 km em menos de 3 horas. Não
me parece muito folgado. O melhor é pôr-me a andar. Ala para S. Vicente!
Felizmente o
percurso é bastante plano e dá para ganhar velocidade. Chego lá às 5h15. Sem
relógio é difícil aferir da velocidade de progressão. Abasteço e saio
novamente, desta vez em direção ao Seixal. 7 km rápidos e planos a ouvir o mar
a bater na praia, e a passar nos túneis antigos, interditados, paralelos aos
mais recentes e modernos.
Chove que se
farta. Numa dessas passagens pela estrada regional 101 antiga, apanho uma tal
bátega que até ando para trás com a força da chuva e do vento. O que vale é que
o bonatti prova ser um excelente impermeável e mantem-me razoavelmente seco.
Apanho o José
Nunes e seguimos juntos até ao Seixal, onde chegamos são 6h43. Ainda está
escuro como breu.
Começa a clarear
quando iniciamos a subida do meio quilómetro vertical, a caminho de Porto
Moniz. Este é dos troços mais bonitos da prova e ainda bem que o fazemos de
dia. Nós os dois devemos ter sido os únicos atletas a percorrer este troço
com visibilidade diurna. Atrás de nós já não vem mais ninguém, pois houve 2
desistências e um barramento no controlo de tempos.
Ainda não
chegámos a Porto Moniz e já o João Oliveira vai na ponta Oeste da Ilha, com
mais de 20 km de avanço.
O José Nunes
desce melhor do que eu e portanto quando finalmente chego ao belíssimo Oásis de
Porto Moniz já ele partiu. Porto Moniz é uma alegria! Como o mais que posso no
abastecimento e encharco-me de coca-cola. 90 km com 3.900 mD+ já cá cantam, mas
vou necessitar de muita energia para fazer o resto.
De cada vez que
me alimento é como se renascesse. Sobretudo após alimentos mais substanciais,
como canjas. Estas provas são indubitavelmente autênticos eventos gastronómicos
em que se safa melhor quem tiver o estomago mais rijo. Estomago e cabeça, são
os dois elementos mais importantes do Ultra Endurance. Só depois vêm as pernas
e o coração, nesta hierarquia de órgãos essenciais para a performance.
Ok, agora há que
subir para as Achadas da Cruz. A subida é empinada mas a energia está renovada.
100 milhas fazem-se por troços. Cada um é diferente e em cada um deles nos sentimo de forma diversa.
Hesito entre virar à esquerda ou continuar em frente mas lá me decido a prosseguir no mesmo caminho.
Às 7h partiram de Porto Moniz os atletas da prova de 80 km.
Quando chego ao
abastecimento dos 100 km já está tudo muito escolhido e pouco resta. São 11h34,
sou o último a passar, já não sobra quase nada. Também não sinto grande
necessidade de abastecer. Ingiro uma das barras energéticas que carrego comigo
e isso é suficiente para me dar alento. Inicio um trote vigoroso e em breve
ultrapasso o José que vai um pouco mais lento. Agora temos que atravessar a
ilha para a costa sul, não sem antes irmos ao ponto mais ocidental, a Ponta do
Pargo.
As pernas já
estão muito massacradas mas vão aguentando a retranca. Chego ao abastecimento
às 13h10. O tempo está ótimo para correr, eu é que já não estou grande coisa.
Encontro o Élio Silva que teve que ficar por aqui.
Indicam-me o
caminho e lá vou eu para os últimos 60 km.
O próximo abastecimento é na lindíssima
vila de Paúl do Mar.
Da Fajá da Ovelha até ao nível do mar vai ser uma descida
com uma vista magnífica.
Às 15h14 sou muito bem recebido no abastecimento. Este
é o 2º ponto de muda de roupa, aos 120 km, e tomam bem conta de mim. Mais uma
canja excelente, e adicionalmente o luxo de um copo de café a escaldar.
Não altero nada
na roupa. Aproveito é para guardar na mochila mais algumas barras energéticas
que tinha colocado no saco. Podem vir a fazer falta. Às vezes passam-se 3 horas
entre abastecimentos, sobretudo quando esses têm mais de 12 km de intervalo.
Saio do
abastecimento e percorro cerca de 2 kms na frente marítima do Paúl até à ponta
oposta. Aqui tem início outra das grandes subidas da prova. Uma subida
interminável, que tem sempre mais uma curva que nos deixa sempre mais afastados das
casas lá em cima. Mas com paciência tudo se consegue e por fim lá chego ao
topo.
Agora há um posto
de controlo sem abastecimento em Estreito da Calheta, que é o ponto de partida
da Maratona.
Na Calheta, ao km
135, temos o abastecimento. Já só faltam 37 kms!!! Agora sei que acabo nem que
o tenha que fazer a andar ou a rastejar. Não seria a primeira vez numa prova de 100 milhas. No
entanto prefiro arranjar forças para correr. Andar 37 kms demora uma eternidade
e é mentalmente muito desgastante quando já se tem 26:23:03 de prova. São agora
18h23 e está a anoitecer rapidamente. Ultrapassei mais dois companheiros que
vêm mais lentos. Um deles acabaria por desistir.
Agora tenho que
me dirigir para a Ponta do Sol no km 143. Forço um trote muito dorido. Vou
lento, pouco mais rápido que uma marcha forçada, mas é o que se consegue. O
retorno da noite trás consigo os seus fantasmas de volta.
Começo a ter
pequenas alucinações. O cérebro vê coisas que não existem. Pessoas onde estão
apenas caixotes do lixo. Animais onde se encontram pedras. Agora o desafio é
sobretudo mental. Obrigar os pés a se moverem sincopadamente, um após o outro.
Não sei a que
horas chego finalmente á Ponta do sol. Parece que passou uma eternidade. Sem
relógio para me orientar o tempo deixa de fluir. Fico suspenso numa limbo
temporal em que os eventos não parecem obedecer a uma ordem causal específica.
Avanço como que
por milagre. Próxima paragem: Ribeira Brava. Como lá cheguei não faço ideia,
mas cheguei.
Agora tenho pela frente um dos maiores desafios da prova: a subida de 600 m para a Quinta Grande. Nesta altura do campeonato é como subir o Evereste. Vai exigir um esforço titânico de todas as fibras do meu ser. Um esforço lento, paquidérmico, constante, irresistível.
Agora tenho pela frente um dos maiores desafios da prova: a subida de 600 m para a Quinta Grande. Nesta altura do campeonato é como subir o Evereste. Vai exigir um esforço titânico de todas as fibras do meu ser. Um esforço lento, paquidérmico, constante, irresistível.
158 km com 6.900
mD+ já estão feitos! Cada prova de 100 milhas é uma prova. Das 5 que já fiz
esta é aquela que tem menor desnível acumulado. No entanto também é aquela para
a qual vim pior preparado (menor treino, maior peso). Para além disso nunca fiz
uma prova que tivesse tanto alcatrão e empedrado. Os meus pés já não aguentam
mais o sapateado no chão duro. Os joelhos felizmente vão-se aguentando, mas os
pezinhos estão nas últimas. Tenho receio de sofrer alguma fratura de esforço. Vamos
ver se isto se aguenta.
Faltam 14 km em
duas etapas. Vou descer para Câmara de Lobos, numa descida infernal, com
milhares de degraus, que vou fazendo como posso. Julgo que o abastecimento
estará no molhe, mas quando lá passado verifico surpreendido que me enganei.
Ainda faltam vários kms para lá chegar. Esse kms vão ser feitos junto ao mar.
Em cada curva vejo um abastecimento com voluntários a acenar. Sempre que lá
chego constato que o cérebro me pregou mais uma partida.
Até À Praia
Formosa ainda vou ter que penar. Lá chegado, o abastecimento é depois de um
túnel muito curioso.
Já só faltam 6 km
planos. No entanto vão ser integralmente feitos a andar, que agora é que já não
dá mesmo para ser de outra forma. A parte inicial é toda pela Promenade, até
que inflete para dentro, para o meio da enorme oferta hoteleira do Funchal. As
pessoas com quem me cruzo não sabem bem como reagir a esta espécie de
alienígena, que caminha apoiado em bastões e com um frontal agarrado à testa.
Devo fazer uma linda figura! E lá vou caminhando por entre os hotéis e os
ocasionais foliões noturnos que me olham espantados. Agora que penso nisso até
me admiro como não mandaram chamar os psiquiatras para me levarem num casaco
branco.
Finalmente chego
ao passeio marítimo do Funchal. Faltam algumas centenas de metros para chegar à
tão almejada meta. Passo a passo vou progredindo lentamente mas seguro da
vitória final.
Chego por fim, às
4 da madrugada, após 36:03:27 de prova, cerca de 23 delas feitas de noite.
Sou visto pelas enfermeiras de plantão. Estou com febre e a pupila não reage à luz. Fora isso a glicémia está um pouco elevada, bem como a pressão sanguínea. Dadas as circunstâncias, acho tudo isso normal. Enquanto espero começo a tremer de frio. A solução é embrulhar-me na manta térmica.
Desisto da massagem e sou transportado até ao hotel no carro de um voluntário.
O banho quente sabe-me como a vida. Meto-me debaixo dos lençóis e durmo um sono reparador.
Às 12h00 os companheiros acordam-me para apanharmos a boleia do Sr. Nobrega que nos leva ao local da entrega de prémios.
Todos quantos terminámos recebemos um prémio. Sou 5º do escalão de M45 e embora só haja 5, também vou ao pódio. É quase uma festa de família. O João e o Paulo fazem 2º do escalão.
O grande vencedor
é o João Oliveira.
Depois da
cerimónia somos convidados pela associação de atletismo para almoçar. Temos o
prazer de almoçar umas belas espetadas Madeirenses em boa companhia.
A carne sabe-me
muitíssimo bem, depois de 36 horas a comer comida de plástico.
Nem janto, vou
logo para a cama assim que regresso ao hotel.
O dia seguinte
passa-se sossegadamente a passear pelo Funchal.
Às 21h15 avião de
volta, e pronto mais uma grande aventura, excelentes momentos de convívio com
os companheiros e uma boa história para contar aos netos. Que mais se pode
querer?
P.S. já me
inscrevi na 6ª. Vai ser a Ronda dels Cims 2017 em torno de Andorra, em Julho
próximo. Ele há gajos que nunca se emendam…
Não te emendes, pois os teus relatos de "viagem" são sempre muito interessantes :). Grande abraço.
ResponderEliminarMuito obrigado amigo!!! Grande abraço! :)
EliminarParece fácil :) Adoro a Madeira e esta prova seduz-me bastante. Talvez para o ano... Parabéns por mais uma! Lá nos veremos por Andorra, apesar de eu ir à Mitic. Um abraço e muitos parabéns!
ResponderEliminarMuito obrigado Filipe! Andorra vai ser épico, seja o Mitic, a Ronda ou mesmo a Euforia. Grande abraço!
Eliminar