Um mundo de histórias que começam e não acabam

Summary "Vivemos num mundo de histórias que começam e não acabam" - Italo Calvino
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"Vivemos num mundo de histórias que começam e não acabam"

- Italo Calvino



Seis começos possíveis


1


Numa Lisboa que poderia ser tantas outras cidades, onde cada beco e avenida se entrelaçam em infinitas possibilidades, X, no limiar de seus dezassete anos, se vê à entrada do Hospital Santa Maria. Este não é apenas um hospital, mas um universo de corredores que se bifurcam, de destinos cruzados e de histórias que se sobrepõem em camadas quase invisíveis.

Nos olhos de X, refletem-se não apenas um, mas múltiplos mundos, cada um com suas próprias realidades, traços juvenis que simultaneamente desabrocham em mil maturidades possíveis. Ao seu lado, dois homens que poderiam ser tantos outros: um com histórias escritas pelo fogo e outro que dançou com o asfalto. Mas, em qual dessas narrativas X realmente existe? Em todas? Em nenhuma?

No epicentro desse labirinto de realidades, X sorri, não um, mas inúmeros sorrisos. Ele entende o jogo das tragicomédias, interpreta papéis em histórias que se desenrolam e retraem, criando e recriando universos. O seu humor, multifacetado, é o escudo que se adapta às incontáveis dimensões do medo.

À medida que caminha em direção ao bloco operatório, as lâmpadas não apenas iluminam, mas também criam e recriam sombras, mundos paralelos pintados nas paredes. O monitor cardíaco, ao seu ritmo pulsante, sugere não apenas uma, mas várias músicas, em estilos e tempos diversos, ecoando em universos sonoros simultâneos.

O passado, esse emaranhado de linhas temporais, regressa não como um, mas como múltiplos fantasmas. O apêndice rebelde de X, em Vila Nova de Gaia, não foi apenas uma batalha, mas uma infinidade delas, em cenários que se multiplicam e transformam.

Nas noites da Unidade de Cuidados Intensivos, a humanidade se desdobra em incontáveis performances. Uma sinfonia de vozes, risos e lamentos se entrelaça, e X, em cada uma de suas versões, percebe a ironia e a beleza dessas narrativas.

No entanto, mesmo em um universo de possibilidades infinitas, algumas histórias se destacam: como a do paciente africano, cujos olhos carregam sonhos que transpassam as dimensões, sugerindo planos de fuga que poderiam ser, ao mesmo tempo, reais e imaginários.

Em cada corredor, em cada sala, X se move entre as linhas de realidade e ficção, como se estivesse, simultaneamente, em todas e em nenhuma. E, à maneira de Italo Calvino, a história não se contenta em ser apenas uma narrativa, mas um intrincado mosaico de possibilidades, onde cada escolha, cada detalhe, se desdobra em infinitos universos.


2


Numa noite pendurada entre os becos e avenidas de Lisboa, quente como um fôlego de verão que sussurra segredos à cidade, X, a um passo de deixar para trás a candura dos seus dezassete anos, adentra o Hospital Santa Maria. Seus olhos, espelhos do mundo, refletem uma maturidade que irrompe, inesperada, dos traços ainda juvenis do seu rosto.

Há algo de teatral, um quê de encenação, na forma como se vê entre dois destinos moldados pelo acaso: um homem marcado por ter dançado demasiado próximo das chamas e outro que selou seu pacto com o asfalto em uma dança de motas. E ali, no cerne dessa tragédia composta, X sorri, um riso que bebe das fontes de tragicomédias, assumindo o papel do humorista. Usa o humor como escudo, uma barreira contra o medo que ronda, ameaçando invadir sua mente, ao passo que se prepara para enfrentar um intestino em rebeldia.

O bloco operatório aguarda, suas lâmpadas gélidas e esterilizadas pintam espectros nas paredes, enquanto o monitor cardíaco, solista de uma orquestra silenciosa, desenrola uma melodia tão intensa que faz X questionar se não estaria captando frequências de um rock desenfreado. Em meio a isso, quase pode ouvir o eco do seu passado, um fantasma insistentemente nostálgico, lembrando-o de um apêndice renegado que, sete anos atrás, em Vila Nova de Gaia, alçou bandeira contra o próprio corpo.

A Unidade de Cuidados Intensivos torna-se um palco, com holofotes iluminando o sofrimento em suas mais variadas nuances. Ali, um homem se dissolve em gemidos, enquanto uma mulher, com voz frágil como cristal, entoa hinos de esperança. E X, ao ritmo dessas canções, sorri para si, reconhecendo a ironia da existência.

Na enfermaria, o absurdo toma proporções grandiosas. Um paciente africano, com olhos que carregam sonetos de liberdade, compartilha sussurros de fuga. X mergulha no jogo, onde o riso se mistura com uma inusitada solidariedade.

E assim, X perambula pelo hospital como se desfilasse em palcos literários, onde vida e morte, riso e dor, realidade e absurdo dançam numa coreografia mágica e imprevisível. Tal qual uma criação de Lobo Antunes, descobre a beleza paradoxal da condição humana, onde tragédias se vestem de comédia, e a desesperança se despe para revelar a esperança.


3


Lisboa, essa cidade-palco, encontra-se suspensa entre o real e o ilusório. E neste palco, a entrada do Hospital Santa Maria se transforma no cenário de uma obra que ainda está por ser escrita. X, um jovem no limiar da vida adulta, não é apenas um ator, mas também uma personagem em busca do seu autor, procurando entender seu papel nesse drama.

Seus olhos, mais do que janelas para a sua alma, são espelhos de uma realidade fragmentada, questionando constantemente o que é real e o que é mera encenação. Ao seu lado, dois homens - seriam eles atores coadjuvantes ou protagonistas de suas próprias histórias? Um marcado pelo fogo, o outro pelo asfalto; suas histórias se mesclam e se confundem, como num roteiro inacabado.

X sorri, mas é um sorriso ensaiado ou genuíno? Ele se vê enredado numa tragicomédia da existência, onde o humor se torna tanto um escudo quanto um questionamento sobre a autenticidade dos sentimentos.

Ao aproximar-se do bloco operatório, o espaço é dominado por uma luz que, em vez de revelar, parece ofuscar a linha entre a realidade e a representação. O som do monitor cardíaco ressoa, não como mera evidência da vida, mas como um metrônomo marcando o ritmo de uma peça que ainda está por ser definida.

O passado de X, a batalha contra um apêndice rebelde em Vila Nova de Gaia, retorna não apenas como uma memória, mas como uma cena que insiste em ser reencenada, um eco de um ato que talvez nunca tenha tido um verdadeiro final.

A Unidade de Cuidados Intensivos não é apenas um local de cura, mas também um teatro de humanidade em sua essência mais crua. As vozes, os lamentos, os risos: são genuínos ou apenas parte da atuação?

E o paciente africano com olhos repletos de sonhos – é ele um símbolo de liberdade ou apenas mais uma personagem em busca de um papel, de um sentido? Juntos, X e o africano parecem co-conspiradores, mas, ao mesmo tempo, prisioneiros de um roteiro que se escreve e reescreve a cada momento.

Em um mundo à maneira de Pirandello, onde a realidade e a ficção estão constantemente em tensão, X se move pelo hospital, ou pelo palco, questionando-se incessantemente: Quem sou eu nesta história? E, afinal, quem é o autor deste drama em que me encontro?


4


Na sombria e ao mesmo tempo luminosa cidade de Lisboa, entre as memórias do passado e as esperanças do presente, X encontra-se à porta do Hospital Santa Maria. Não é uma entrada simples, mas uma porta que carrega o peso de mil histórias, de vidas entrelaçadas e destinos alterados. É um limiar entre a fragilidade humana e a esperança da cura.

Os olhos de X são profundos, quase geológicos, testemunhando camadas de experiências e introspecções. Em seu olhar, vê-se o reflexo de uma humanidade que busca, constantemente, significado em meio ao caos. Ao seu lado, dois homens, cujas histórias são inscritas não em palavras, mas em cicatrizes: um marcado pelo fogo, o outro, pelo cruel beijo do asfalto.

O sorriso de X, no meio deste ambiente, não é de ironia, mas de resistência. É um ato de desafio contra o medo que se esgueira nos cantos mais escuros da mente. A sua batalha, contra um intestino rebelde, não é apenas física, mas também existencial.

No bloco operatório, sob a luz impessoal e fria, X confronta-se com a dualidade da vida: a promessa de cura e a ameaça de falência. O monitor cardíaco, com seu ritmo constante, não é apenas um lembrete de sua vitalidade, mas também uma metáfora da fragilidade da existência.

A lembrança do passado, da guerra de seu corpo contra si mesmo em Vila Nova de Gaia, regressa não com nostalgia, mas como uma meditação sobre a transitoriedade da vida. Os momentos de dor e medo são intercalados com reflexões sobre o absurdo da condição humana.

Na Unidade de Cuidados Intensivos, as histórias humanas desenrolam-se como fios interligados. O som de gemidos, sussurros de esperança, e até canções são ecos da persistente vontade humana de resistir e encontrar significado.

O paciente africano, com olhos que refletem sonhos de liberdade, não é apenas um companheiro de enfermaria, mas um espelho da busca de X por pertencimento e compreensão.

Com a clareza e introspecção característica de Primo Levi, a jornada de X no hospital torna-se uma meditação sobre a condição humana, a busca por cura, não apenas física, mas também espiritual, e a eterna luta para encontrar significado no meio do caos.


5


Na fervilhante tapeçaria de Lisboa, onde histórias antigas e modernas se entrelaçam e o mágico e o mundano se confundem, X, um jovem de olhos vívidos, entra no Hospital Santa Maria. Este hospital, mais do que um mero edifício, é um cruzamento de destinos, um labirinto de narrativas e uma fonte de milagres e tragédias.

Seus olhos, tão profundos quanto os antigos poços da cidade, contêm mundos e narram histórias de gerações. Ao ser posicionado entre dois homens - um que carrega as marcas de um encontro ardente com o fogo, o outro uma vítima do abraço cruel do asfalto - X percebe-se envolto em um cosmos de histórias que convergem e divergem.

Em meio ao caos palpável, X sorri, mas não é um sorriso comum. É um sorriso que fala de legados, de fábulas passadas de avós para netos, um sorriso que revela o humor que se encontra nas interseções da vida e da morte, do destino e da vontade.

No bloco operatório, aonde as luzes brancas lançam sombras e revelações, o monitor cardíaco canta canções ancestrais, lembrando X de tambores de festivais esquecidos. E esse ritmo faz com que ele se pergunte, meio em desespero, meio em brincadeira, se não estaria ouvindo os acordes de uma antiga lenda musical.

E então, como num conto mágico-realista, o passado de X em Vila Nova de Gaia ressurge. Seu apêndice, esse pequeno traidor, não apenas uma parte do corpo, mas um personagem em si, volta a reivindicar sua narrativa. E, neste hospital, as linhas entre o que foi, o que é e o que poderia ser tornam-se maravilhosamente turvas.

As noites na Unidade de Cuidados Intensivos tornam-se uma arena onde o fantástico desabrocha. Sons, cores e sonhos se entrelaçam, enquanto um homem entoa encantamentos e uma mulher, frágil como a porcelana mas forte como o aço, canta canções que lembram as esperanças de tempos antigos.

E então, na tapeçaria do hospital, surge um paciente africano, cujos olhos refletem não apenas a dor, mas contos de desertos vastos e céus estrelados. Juntos, X e ele tecem histórias, misturando sonhos e realidades.

Ao estilo inconfundível de Rushdie, a saga de X no Hospital Santa Maria torna-se uma epopeia de identidade, destino e as múltiplas camadas da realidade. E em seu núcleo, está a perene busca pela verdade em meio às maravilhas do contado e do vivido.


6


Em uma Lisboa que poderia ser a mesma que conhecemos, mas que também poderia pertencer a um livro perdido nas prateleiras infinitas de uma biblioteca imensa, X se encontra diante do Hospital Santa Maria. Não é um hospital qualquer, mas talvez um labirinto de corredores intermináveis, onde cada porta revela uma realidade diferente, onde cada quarto é um universo em si.

Os olhos de X, profundos como labirintos borgeanos, carregam em si todos os mapas e espelhos da cidade. Ao ser posicionado entre dois seres - um marcado por chamas que poderiam pertencer a um antigo mito, e o outro com cicatrizes que contam a tragédia de um encontro feroz com o destino - X percebe que não está apenas em um hospital, mas em um cruzamento de inúmeras histórias, um ponto onde o tempo e o espaço se entrelaçam de maneiras insondáveis.

A súbita risada de X é a risada do homem que compreende a vastidão do infinito, a interconexão de todos os acontecimentos e a ironia de estar preso em um instante eterno. O bloco operatório, com sua luz fria e esterilizada, não é apenas um lugar de cura, mas um portal para realidades alternativas, onde cada instrumento tem sua própria saga, seu próprio labirinto.

O bater do monitor cardíaco, para X, não é apenas um sinal de vida, mas um eco dos tambores que ressoam nas vastas galerias da Biblioteca de Babel, um lembrete constante da multiplicidade do universo.

E assim, nas profundezas de sua memória, o passado retorna. No entanto, este não é o passado como o conhecemos, mas um de incontáveis passados possíveis, onde uma simples inflamação do apêndice se transforma em uma odisseia através dos corredores do tempo.

A Unidade de Cuidados Intensivos, então, não é apenas uma sala de hospital, mas uma galeria de destinos, onde cada sussurro, cada gemido, é uma narrativa que se desdobra em mil outras.

O paciente africano, com olhos que são portais para terras distantes, compartilha com X não apenas palavras, mas enigmas, parábolas e labirintos de significado.

Neste relato à maneira de Borges, o Hospital Santa Maria torna-se um microcosmo da vastidão do universo, um lugar onde cada detalhe contém o infinito e onde X, como um viajante perdido em um labirinto de espelhos, busca compreender o insondável mistério da existência.



Continuações imaginárias


7


Em uma manhã chuvosa, os corredores do Hospital Santa Maria pareciam esticar-se e retorcer-se como se estivessem vivos, e um aroma de flores do mar se infiltrava pelos cantos. A chuva trouxe consigo os murmúrios de ancestrais, e as paredes, outrora brancas e estéreis, pareciam pulsar com histórias não contadas. Era como se o hospital tivesse sido transportado para Macondo, e cada pessoa nele fosse tocada por uma mágica suave e irresistível.

X, agora reconhecendo a familiaridade da magia realista que o envolvia, descobriu que seus passos o levavam não apenas pelos corredores do hospital, mas também através das memórias e vidas dos que lá habitavam. Ao passar por uma enfermaria, ele viu uma mulher antiga, com cabelos longos e prateados que flutuavam ao redor dela, tecendo histórias com suas mãos enquanto cantarolava canções esquecidas pelo tempo.

Ao se aproximar de uma janela, X viu uma borboleta amarela que, de algum modo, parecia familiar. Ela dançava no ar antes de pousar suavemente em sua mão, e ele sentiu uma onda de emoções - amor, perda, esperança - tudo vindo da delicada criatura.

O paciente africano, cujos olhos anteriormente eram portais para terras distantes, agora brilhava com uma aura dourada. Ele compartilhou com X um segredo: em sua terra natal, existia uma lenda de um hospital que não apenas curava corpos, mas também almas, um lugar onde os limites entre o passado, presente e futuro eram apenas ilusões. Era dito que aqueles que entravam nesse hospital e eram tocados por sua magia, nunca mais seriam os mesmos.

À medida que os dias se transformavam em noites e as noites em dias, o tempo no Hospital Santa Maria parecia se distorcer. Pacientes que estavam à beira da morte encontravam renovação e vigor em momentos misteriosos; enfermeiras e médicos, antes céticos, agora compartilhavam histórias de milagres e coincidências inexplicáveis.

No entanto, para X, a maior revelação foi sua própria transformação. O hospital, com sua mágica inegável, o fez ver que a verdadeira cura não vinha de medicamentos ou procedimentos, mas do reconhecimento e aceitação das maravilhas e tragédias que formam a tapeçaria da vida.

E assim, em um crepúsculo tingido de dourado, X deixou o Hospital Santa Maria, não apenas curado de suas aflições físicas, mas também com uma alma renovada e repleta de maravilha. Ele carregava consigo as histórias, os mistérios e a magia de um lugar onde a realidade e o fantástico coexistiam, um lugar que só poderia ter sido tocado pela mão de Gabriel García Márquez.


8


O Hospital Santa Maria, sob o olhar atento e detalhado de Thomas Mann, transformou-se num cenário opressivamente europeu, refletindo o peso da tradição e da história que permeia o Velho Continente. O hospital, antes pulsante de magia, agora ecoava a melancolia da passagem do tempo e a inexorabilidade do destino humano.

X encontrava-se em uma situação cada vez mais introspectiva. Os corredores longos e frios pareciam se estender infinitamente, lembrando-lhe os corredores do tempo e a inevitabilidade da morte. Cada passo que dava ressoava com o peso das gerações passadas e as questões profundas da existência humana.

A mulher com cabelos prateados, que anteriormente tecia histórias com as mãos, agora representava a passagem do tempo. Seu canto melancólico falava de dias passados, de amores perdidos e do inevitável declínio. O paciente africano, antes radiante de energia mística, agora possuía uma gravidade que contava histórias de colonialismo, deslocamento e a busca de identidade em um mundo em constante mudança.

X começou a questionar a natureza da sua cura e o verdadeiro significado da saúde e da doença. Era a sua enfermidade uma mera aflição física ou uma manifestação de um mal-estar mais profundo, uma doença da alma? Em conversas longas e filosóficas com os médicos, ele explorou as dualidades da vida e da morte, do corpo e da mente, do individual e do coletivo.

Em uma noite particularmente fria e silenciosa, X teve um encontro revelador com um médico idoso, que lhe falou sobre a natureza transitória da vida e a busca eterna pela verdade e pelo significado. O médico, com seus olhos cansados e mãos trêmulas, parecia ser a personificação do tempo, e sua sabedoria, forjada pelas décadas de experiência, era uma janela para as profundezas da condição humana.

A estadia de X no Hospital Santa Maria, sob a penumbra do estilo de Thomas Mann, tornou-se uma jornada de autodescoberta e introspecção, onde cada momento era um lembrete da fragilidade e da complexidade da existência humana. E quando finalmente deixou o hospital, não foi apenas como um paciente curado, mas como um homem que havia se confrontado com os abismos mais profundos da alma e emergido com um entendimento mais profundo de si mesmo e do mundo ao seu redor.


9


Nos corredores sinuosos do Hospital Santa Maria, um nevoeiro inexplicável começou a se formar, densificando-se até obscurecer as paredes antes brancas. Em meio a essa névoa, figuras sombrias e caricatas apareciam, transformando o ambiente hospitalar num palco de absurdos e eventos sobrenaturais.

X, ainda atormentado pelas revelações existenciais da sua estadia anterior, agora encontrava-se frente a uma realidade ainda mais bizarra. Um médico de olhar felino, vestindo um casaco longo e negro, apareceu a ele, introduzindo-se como Dr. Woland. Atrás dele, um enorme gato preto, que fumava um cachimbo e ocasionalmente emitia risadas sarcásticas, observava a cena com desdém.

O Dr. Woland ofereceu a X um trato. A cura completa de sua enfermidade em troca de uma simples tarefa: organizar um espetáculo no teatro do hospital, um espetáculo que desvelaria as fraquezas e hipocrisias dos habitantes de Lisboa. X, hesitante mas desesperado pela promessa da cura, aceitou.

Durante a preparação, os corredores do hospital tornaram-se ainda mais caóticos. O paciente africano, antes uma figura de sagacidade e esperança, agora dançava freneticamente ao som de músicas distorcidas que pareciam vir de outro mundo. A mulher com cabelos prateados começou a profetizar o futuro com uma precisão assustadora, enquanto o gato preto causava travessuras, transformando médicos em estatuas e enfermeiras em pombas.

A noite do espetáculo chegou, e o teatro do hospital estava repleto de lisboetas curiosos. As cortinas se abriram para revelar um palco onde a realidade e a fantasia colidiam. O Dr. Woland, servindo como mestre de cerimônias, apresentou uma série de atos que desmascaravam as falhas humanas de maneira grotesca e hilária, expondo a natureza dual da humanidade.

Ao final do espetáculo, com a plateia em total perplexidade, X foi chamado ao palco. Dr. Woland, com um sorriso enigmático, declarou-o curado e desapareceu, deixando para trás apenas o gato preto, que lançou a X um último olhar sarcástico antes de evaporar em uma nuvem de fumaça.

O Hospital Santa Maria retornou à sua normalidade aparente, mas X, tendo testemunhado o teatro do absurdo de Bulgakov, deixou o lugar não apenas com sua saúde restaurada, mas com a inquietante compreensão de que, por trás da realidade, se esconde sempre uma dose de loucura e surrealismo.


10


No Hospital de Santa Maria, sob a escuridão da noite Lisboeta, X encontrou-se entrelaçado no tecido da tragédia e comédia humanas, onde cada corredor ressoava com os ecos de histórias passadas.

"Good Dr. Álvaro, pray tell, why do these halls whisper of bygone tales?" X questionou, seu peito inflado de inquietação.

Dr. Álvaro, com seu olhar perscrutador e sábio, respondeu, "In these walls, dear lad, reside the souls of yesteryears, each carrying a tale of love, loss, and life's fleeting dance."

Como um jovem Hamlet, X sentiu o peso da existência, a agonia da escolha e a inescapabilidade do destino. "To be or not to be in this maze of memory and reality?" ele murmurou, sua mente a girar.

"Life's but a walking shadow, a poor player that struts and frets his hour upon the stage," respondeu Dr. Álvaro, "But in this hospital, the play takes on a life of its own, where every patient, every doctor, every soul is both an actor and audience."

Em meio a esta revelação, figuras do passado de X surgiram, vestidas com as vestimentas da renascença, suas vozes ecoando como coros de uma tragédia grega. Sua mãe, seu primeiro amor, seu avô - todos cantaram uma balada de amor e perda, guiando X através do labirinto da sua própria alma.

E enquanto a noite cedia lugar à alvorada, X, agora transformado, declarou com determinação, "Though this be madness, yet there's method in't. I shall embrace my past, confront my fears, and stride forth into the morrow, for all the world's a stage, and I am but a player in this grand play of life."

Assim, sob a penumbra da cidade adormecida, o Hospital Santa Maria tornou-se não apenas um santuário de cura, mas também um teatro onde a comédia e a tragédia da existência humana eram encenadas com fervor e paixão, à maneira de Shakespeare.


11


Em meio às vastidões inexploradas dos corredores do Hospital de Santa Maria, X sentiu-se como um capitão navegando por mares desconhecidos, buscando, talvez, um monstro branco que simbolizasse sua angústia interna. Este edifício era como o próprio Pequod, com sua estrutura complexa e habitantes tão variados quanto os marinheiros de diferentes terras sob o comando do Capitão Ahab.

Dr. Álvaro, o respeitado médico do hospital, parecia ter o mesmo olhar perdido no horizonte que Ahab tinha, um olhar que via mais do que os mortais comuns. "X", disse ele, com uma voz profunda e ressoante, "o que você busca nestes corredores é mais do que cura. Assim como o mar, este hospital tem seus mistérios, suas profundezas, seus leviatãs."

X, refletindo sobre a observação do médico, sentiu uma estranha ligação com o vasto oceano, como se o hospital fosse apenas uma representação terrestre da imensidão do mar. "Talvez eu esteja procurando por minha própria Moby Dick," ele murmurou, "uma entidade que simboliza minha dor, minha busca, minha luta contra o desconhecido."

Dr. Álvaro sorriu. "Muitos entram aqui com suas próprias baleias para caçar, seus próprios demônios para confrontar. A questão é: você está pronto para embarcar nesta viagem, enfrentar a tempestade e emergir transformado, ou se deixará ser engolido pelas ondas?"

As noites no hospital pareciam se estender por uma eternidade, com o eco dos gritos dos pacientes ressoando como o uivo do vento em um navio à deriva. X encontrou-se frequentemente contemplando a vastidão da existência humana, a luta constante entre vida e morte, saúde e doença, esperança e desespero.

E assim, à maneira de Melville, a narrativa se desenrolou, não apenas como uma história de um jovem em um hospital, mas como uma meditação profunda sobre a natureza da existência, a busca incessante do homem pelo significado e a luta eterna contra os monstros que habitam dentro e fora de nós.


12


Nos silêncios que se alastravam pelos corredores do Hospital de Santa Maria, X descobria em si múltiplas facetas, quais heterônimos desabrochando sob o céu cinzento de Lisboa. Cada passagem, cada porta entreaberta, revelava-lhe mais uma sombra de si mesmo, como se o edifício refletisse o labirinto interno do seu ser.

À janela do seu quarto, fitando as luzes trêmulas da cidade, ele murmurou palavras que mais pareciam emanar de Álvaro de Campos: "Neste hospital de almas e corpos quebrados, sinto-me fragmentado, um estranho a mim mesmo. Sou simultaneamente o doente e o observador, o sonhador e o desperto."

Em certas noites, sob a influência do luar que invadia o seu quarto, X escrevia versos, inspirados talvez por Ricardo Reis: "Ao som dos sussurros da noite, resigno-me ao destino; pois na fragilidade da carne, descubro a eternidade do espírito."

E em momentos mais introspectivos, era como se Fernando Pessoa, ele próprio, tomasse conta dos seus pensamentos: "No espelho do hospital, encontro a multiplicidade do meu ser. Quem sou eu nesta vastidão de sentimentos? Um paciente, um poeta, um sonhador? Ou apenas um homem em busca de si mesmo, na imensidão da sua própria alma?"

Dr. Álvaro, percebendo a profundeza da introspecção de X, questionou-lhe: "Já descobriste, meu caro, quem verdadeiramente és neste teatro da existência?"

X, com um olhar distante, respondeu: "Cada dia, cada momento, revela-me um novo 'eu'. Aqui, neste santuário de dor e esperança, descubro que sou muitos. E na multiplicidade, talvez, encontre a minha verdadeira essência."

Assim, o Hospital Santa Maria não era apenas um espaço de cura, mas também um lugar onde as almas, como a de X, se desdobravam em múltiplos ecos, à maneira de Pessoa, buscando compreender a complexidade da existência humana.


13


Num Hospital de Santa Maria que mais se assemelha a um laboratório de almas, X se percebe confinado num microcosmo que amplifica os dilemas e conflitos do mundo exterior. Aqui, a ciência e a humanidade estão em constante diálogo, por vezes amigável, por vezes em franca oposição, como se fossem substâncias que reagem de maneiras inesperadas quando misturadas.

O passado invade sua memória com uma persistência química; uma reação irreversível. O apêndice rebelde de sete anos atrás agora parece um prelúdio de uma ópera mais complexa. Assim como o átomo que não pode ser dividido sem liberar energias inimagináveis, X percebe que cada evento de sua vida, mesmo aqueles que pareciam insignificantes, contêm em si o potencial para grandes transformações.

Na Unidade de Cuidados Intensivos, ele é testemunha de sofrimentos alquímicos, onde cada paciente é tanto um elemento quanto um composto, cujas partes estão em fluxo constante, quebrando e formando ligações em uma dança infinita. O paciente africano que lhe sussurra planos de fuga, por exemplo, torna-se um catalisador para reflexões sobre liberdade e encarceramento. É como se o espaço confinado do hospital funcionasse como um retículo cristalino onde todos os destinos estão interligados, ainda que em padrões que desafiam a compreensão imediata.

A própria medicina, com seus instrumentos e substâncias projetados para entender e manipular o corpo humano, torna-se um estudo fascinante para X. Os médicos e enfermeiros tornam-se alquimistas, transformando elementos em curas e, às vezes, acidentalmente, em venenos. No seu íntimo, X compreende que toda intervenção carrega consigo uma ética implícita, um poder que deve ser manuseado com grande cuidado.

Na quietude do seu quarto de hospital, entre o pôr do sol e o emergir das estrelas, X começa a escrever. Ele não redige apenas para compreender a si mesmo ou aos outros, mas para investigar o universo tangível e intangível que se revela através das relações humanas e dos fenômenos naturais. Ele escreve para sondar a fragilidade e a resiliência da condição humana, para dissecar a complexidade da vida e da morte, e para explorar a intersecção entre o absoluto e o relativo, o eterno e o efêmero.

E assim, X, embora confinado em um espaço finito, encontra na escrita um portal para a infinitude, uma maneira de transcender os limites de seu corpo frágil e explorar as extensões vastas e insondáveis da existência humana. Tal como Primo Levi, que encontrou na química uma linguagem para descrever o indescritível, X encontra no microcosmo do hospital uma lente através da qual ele pode examinar a vida em toda a sua complexa e desconcertante beleza.





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