Estudante de Intercâmbio - 12º ano nos EUA

Summary Durante um ano inteiro vivi dentro do filme "Peggy Sue Casou-se".
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Cerimónia de Graduação na Hibriten High School


Tenho em mim como uma bruma
Que nada é nem contém
A saudade de coisa nenhuma,
O desejo de qualquer bem.

Sou envolvido por ela
Como por um nevoeiro
E vejo luzir a última estrela
Por cima da ponta do meu cinzeiro

Fumei a vida. Que incerto
Tudo quanto vi ou li!
E todo o mundo é um grande livro aberto
Que em ignorada língua me sorri.

- Fernando Pessoa




O que é a AFS-Intercultura?

A AFS-Intercultura é uma organização internacional de voluntários sem fins lucrativos que promove oportunidades de aprendizagem intercultural para estudantes e famílias em todo o mundo 7. Fundada em 1947, a AFS tem o objetivo de ajudar as pessoas a desenvolver conhecimentos, habilidades e compreensão intercultural por meio de programas de intercâmbio e voluntariado



Dezasseis anos... tinha dezasseis anos quando fui para os EUA.

Após passar pelo processo de seleção em Portugal, fui escolhido para ir passar um ano, o 12º ano, o último do ensino secundário, nos EUA, em casa de uma família de acolhimento.

A família de acolhimento que nos é atribuída é uma lotaria, tal como o é aquela onde nascemos. Podemos ter mais ou menos sorte.




Eu tive muita sorte. Fui colocado numa família extremamente acolhedora e afável, que me deixou muito boas memórias.

É uma experiência muito rica estar um ano inserido num ambiente e cultura muito diferentes daquele de onde provimos. Força-nos a abrir horizontes e perceber que a realidade a que estamos habituados não é a única existente neste vasto mundo.

Fui colocado na mesma escola onde estudavam os meus irmãos de acolhimento. Hibriten High School, em Lenoir, no estado da Carolina do NorteLenoir é uma povoação bastante pequena, com uma população que não chega a 20.000 habitantes. O bairro da Portela de Sacavém de onde eu vinha, teria grosso modo o mesmo número de habitantes.


Durante um ano inteiro vivi dentro do filme "Peggy Sue Casou-se".



"Peggy Sue Casou-se" é um filme de 1986 dirigido por Francis Ford Coppola e estrelado por Kathleen Turner. A história centra-se em Peggy Sue, uma mulher de 43 anos à beira do divórcio, que participa da comemoração dos 25 anos de formatura. Durante o evento, ela volta no tempo e tem a chance de refletir sobre sua vida e escolhas."



Tive direito à experiência completa de ser um estudante finalista numa escola do interior norte americano:

Participar nessa curiosa cerimónia norte-americana que é o "dating" (saídas casuais, combinadas com membros do sexo oposto, mas que obedecem a um determinado número de expectativas e regras sociais).

Praticar variados desportos (1 por trimestre: futebol, luta greco-romana e atletismo em pista), e ser "Letterman" (reconhecimento por excelência no desporto), coisa que consegui fazer em todos esses 3 desportos, e receber o casaco com a inicial da escola.

Assistir aos Jogos de Futebol Americano, sobretudo o do "Homecoming".

Fazer parte do Homecoming Court (The homecoming court usually consists of students elected by their peers to represent their grade. The court might have a royal theme with kings, queens, or other royal figures (though many schools adopt a non-royal or non-gendered theme). Being selected for the court is usually considered a great honor.)

Ser eleito pelos pares, para os "Senior Superlatives", na categoria de "Friendliest".

Participar no "Powder Puff" football game, em que os géneros trocavam de funções: as mulheres jogavam e os homens fazia o cheerleading, devidamente travestidos.

Ir ao Baile de Finalistas, "Prom", com uma "date".

Participar na cerimónia de graduação dos finalistas.

Ser entrevistado para o "yearbook".

Enfim, o pacote completo.



Homecoming Court


Senior Superlatives


Yearbook interview


Soccer nos EUA, Futebol em todo o resto do mundo



A ser festejado, depois de marcar um golo (direita, em baixo)



Equipa de Luta Greco-Romana (2ª fila, 3º a contar da esquerda)


Eu sou o de costas com cabeleira negra.



Atletismo



AFS Club



Família de acolhimento, chegada, aniversário



Casa, aniversário



Festa de Aniversário surpresa com os amigos, com a família, e Luta greco-romana 


Foto dos amigos portugueses. Cerimónia de graduação, lançamento de space-shuttle no Cabo Canaveral



A chegada aos EUA ocorreu no mês de Agosto. Estivemos uma semana a receber orientação antes de sermos colocados na família.

Passei essa semana um pouco apreensivo com esta enorme mudança para alguém ainda tão novo. Mas esse estado de apreensão dissipou-se assim que a orientação terminou e conheci a família face-a-face no aeroporto.

Aí entrei em modo extrovertido, eu que sou introvertido por natureza.

Desde o início que houve química entre nós. Demo-nos logo muito bem.

Em 1984, o ano em que começou esta aventura, Portugal era um país muito diferente do que é hoje. Ainda não estávamos na CEE e tínhamos acabado de sair de mais uma intervenção do FMI.


Segunda Intervenção (1983-1985)

Após um breve período de recuperação, Portugal voltou a enfrentar dificuldades económicas no início dos anos 80, com o déficit orçamental e a dívida externa aumentando rapidamente 18. Em 1983, o governo assinou um novo acordo com o FMI, que envolveu um empréstimo de 1,1 bilhões de dólares em troca de políticas de austeridade mais rigorosas.


Eramos um país pobre, sem infraestruturas, cinzento, acabrunhado e muito provinciano.

Comia-se a fruta da época e ainda não se tinha acesso a um mercado globalizado. Não havia cadeias de grandes supermercados (o primeiro Continente foi inaugurado no Porto em 1985), nem grandes Shoppings (o Amoreiras foi inaugurado em 1985), nem caixas multibanco (apareceram em 1985).

Não havia cadeias de fast-food (1º MacDonald's em 1991), nem grandes lojas de marca. Muita gente comprava a roupa nas feiras.

Enfim, um país muito diferente daquele que temos hoje, plenamente integrado na economia mundial.


Mas isso tudo resultava em que para mim tudo fosse uma enorme novidade. Sobretudo para uma mente jovem e ainda muito impressionável.


Os primeiros namoros. As miúdas muito pintadas e com aquelas permanentes típicas dos anos 80. Eles com risco ao meio e bigode (parece que agora voltou a estar na moda). Aquela cultura muito estereotipada, de cidadezinha do interior sul americano, onde toda a gente se conhecia.

O racismo ainda muito latente (os direitos civis eram ainda muito recentes), com alguns mecanismos efetivos de segregação impostos por normas sociais. Por exemplo, a censura social muito forte sobre a miscegenação. Até mesmo ao nível do próprio namoro.



Movimento dos Direitos Civis (1950s-1960s)

Este período foi crucial para a conquista dos direitos civis, especialmente para a população afro-americana. Alguns marcos importantes incluem:

  • Decisão Brown v. Board of Education (1954): A Suprema Corte declarou a segregação racial nas escolas públicas inconstitucional.
  • Lei dos Direitos Civis de 1964: Proibiu a discriminação com base na raça, cor, religião, sexo ou origem nacional em empregos, escolas, e acomodações públicas.
  • Lei dos Direitos de Voto de 1965: Proibiu práticas de votação discriminatórias que tinham sido adotadas em muitos estados do sul.
  • Lei de Habitação Justa de 1968: Proibiu a discriminação na venda, aluguel e financiamento de habitações com base na raça, cor, religião, sexo ou origem nacional.



A grande religiosidade da sociedade, em contraste com o laicismo europeu.

A cultura da testosterona e do machismo. A validação masculina pelas proezas desportivas e feminina pela beleza.

Uma cultura social extrovertida mas bastante superficial.

As normas e rituais sociais rígidos (suponho que para conseguir fazer funcionar o "melting pot" de culturas que são os EUA; se é mais ou menos "melting" isso daria para uma outra discussão).

A grande aposta no voluntariado (em contraste com a aposta europeia no assistencialismo do Estado).

A cultura do automóvel e a necessidade de possuir um para nos conseguirmos deslocar.

As casas de madeira e os terrenos sem muros.



Em suma, foi para mim uma experiência de grandes contrastes e muito rica. Com muitas coisas boas e muitas coisas menos boas, como em todas as sociedades humanas. Aprendi muito e obrigou-me a sair da casca (zona de conforto, como se diz hoje em dia).





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